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  • hikafigueiredo

"4 Meses, 3 Semanas, 2 dias", de Cristian Mungiu, 2007

Atualizado: 23 de ago. de 2019

Filme do dia (90/2019) - "4 Meses, 3 Semanas, 2 dias", de Cristian Mungiu, 2007 - 1987. No governo socialista romeno, o aborto é ilegal e punido com prisão. Neste panorama, Gabita (Laura Vasiliu) descobre-se grávida. Desesperada, pede ajuda para a amiga Otilia (Anamaria Marinca). Juntas, as amigas buscarão meios de fazer um aborto ilegal.





Excepcional. É o mínimo que posso dizer desta obra prima, agraciada com a Palma de Ouro em Cannes em 2007. O filme retrata, como nenhum outro que tenha visto até hoje, os meandros da opressão feminina, os mais profundos medos das mulheres e suas percepções de mundo. Perscrutei minha memória e realmente não me lembro de nenhuma outra obra cujo cerne seja o aborto. Na maioria das vezes, o aborto surge na história como um plus no enredo, mas, aqui, ele é o assunto central. No filme - como, usualmente, na realidade - a gravidez indesejada e o aborto são elementos de preocupação exclusivamente femininos. Como no mundo real, após a relação que originou a gravidez, o homem responsável por esta gestação simplesmente lava as mãos e empurra o "problema" para a mulher. Na história, sequer se cita o nome do homem que engravidou Gabita e, se ela não está completamente só, é apenas pela presença da amiga Otilia. O filme, por sinal, é uma aula de sororidade, pois, mesmo diante da violência extrema que se apresenta para Gabita e Otilia, esta última não "abandona o barco", permanecendo ao lado da colega de quarto. Mas, não pense que gravidez indesejada, abandono paterno e aborto são os únicos elementos de opressão feminina que surgem ao longo da narrativa - nãããão!!! O combo vem completo! Temos uma cena onde a personagem Otilia se apavora ao perceber que está sozinha numa rua escura com um homem desconhecido (e qualquer mulher sabe do que estamos falando), temos a cena em que Otilia discute com o namorado por ele não ter respeitado um pedido dela, temos a indescritível cena do jantar onde qualquer voz de Otilia é silenciada e temos a cena do estupro - sim, temos uma junção de tudo o que massacra e apavora qualquer mulher em qualquer lugar do mundo. Juro que até pensei que o filme tivesse sido dirigido por uma mulher, tal a sensibilidade com que os temas são percebidos e expostos - fiquei realmente surpresa ao descobrir que o diretor é um homem; Cristian Mungiu está de parabéns! A obra, ainda, é um retrato interessante da Romênia às vésperas da derrocada do governo socialista - o comércio informal, o contrabando, o desabastecimento, o controle estatal, tudo isso é representado no filme. Formalmente, gostei muito da câmera "nervosa", chacoalhando de cá para lá junto com a personagem Otilia; amei a cena do jantar, alongada até o limite do suportável, expressando toda a agonia e o silenciamento de Otília, e, para tanto, a opção da câmera estática. O roteiro é amarradíssimo, sem qualquer aresta a ser retirada. Com relação às interpretações, o grande destaque é Anamaria Marinca como Otília - ela consegue passar uma gama incrível de emoções, muitas vezes sem dizer nada (mais uma vez, lembro da agoniante cena do jantar, perfeita). Gente... o filme é FANTÁSTICO!!! Recomendo com louvor.

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