Filme do dia (64/2020) - "Açúcar", de Renata Pinheiro e Sérgio Oliveira, 2017 - Bethânia (Maeve Jinkings) retorna para as terras da família, um velho engenho de açúcar na Zona da Mata pernambucana. No local, terá de confrontar os pecados do passado e os atuais trabalhadores da terra, os descendentes dos antigos escravos do lugar.
Na minha opinião, o filme tem um ótimo argumento, um grande potencial semi-explorado e um desfecho incompreensível. O filme trabalha a decadência dos antigos senhores de engenho com a falência de seus negócios e a questão racial - ainda que o engenho esteja falido, Bethânia agarra-se aos seus antigos privilégios e acredita ter superioridade em relação aos antigos funcionários do engenho, todos descendentes de ex-escravos que tentam manter vivas as tradições de seus antepassados. O racismo de Bethânia está tão arraigado em sua alma, a certeza de que os antigos funcionários têm uma dívida com ela e seus antepassados é tão sólida que não há qualquer verniz nela em seu tratamento aos trabalhadores do local. E isso, inclusive é verbalizado na cena da festa. O argumento é ótimo, mas a ideia se desenvolve aos trancos e apoia-se excessivamente em simbologias que tornam o filme hermético. As alegorias iniciais - a chegada de Bethânia em uma jangada, a cena do sexo na cachoeira - ainda são possíveis de se interpretar, mas, mais para o final do filme, a compreensão do que os diretores quiseram dizer ficar bastante difícil - o que são aquelas cenas desfocadas com pessoas se contorcendo, o que eles quiserem dizer com aquilo? E o desfecho (sem spoilers) - o que significa? Eu assumo: não sei qual foi a intenção dos diretores e saí da sessão com cara de "ué?". Uma pena, porque a obra tinha muito potencial. De pontos positivos - uma fotografia belíssima, aproveitando bem a locação e a atmosfera de decadência do engenho; o elenco - Maeve Jinkings é uma senhora atriz, extremamente expressiva, seu olhar tem muita força; Dandara de Moraes também mostrou seu talento, como a altiva Alessandra, assim como Magali Biff como a odiosa madrinha de Bethânia, Dona Branca. Legal também o elenco firmado em profissionais do sexo feminino; a trilha sonora é bastante boa, com destaque para a música "Tudo Tudo Tudo" (amo!!!). Definitivamente, o problema ficou no hermetismo da obra por conta das alegorias nem sempre fáceis de se entender. Ainda assim, dá para aproveitar uma parte do filme. Aceito interpretações da cena final.
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