Filme do dia (89/2017) - "A Infância de Ivan", de Andrei Tarkovski, 1961 - Rússia, 2a Guerra Mundial. O jovem Ivan (Nikolai Burlyayev), de onze anos, colabora com as tropas russas, atuando como espião no front inimigo. Órfão desde que sua mãe foi morta pelos exército alemão, Ivan se nega a afastar-se da zona de combate, empenhando-se, com convicção, em sua perigosa função.
Neste sensível e contundente filme sobre guerra, temos uma mostra dos efeitos desta sobre a infância. As cenas do front e de seus horrores são contrapostas, ao longo do filme, às cenas idílicas do período pré-guerra, quando Ivan era uma criança como outra qualquer, sem marcas decorrentes da guerra, vivendo uma infância feliz e despreocupada junto à sua mãe e sua irmã. Como o resto da filmografia de Tarkovski, essa obra é bastante sensorial, fazendo o espectador experimentar os mais diversos sentimentos e sensações decorrentes da vivência do filme. Também temos as recorrentes imagens oníricas que, aqui, refletem um passado leve e feliz que não existe mais. A fotografia colabora bastante com esse clima de sonho bom (vida passada) ou de pesadelo (presente) vivenciado por Ivan. Aliás, imageticamente, o filme é uma verdadeira obra de arte, algumas cenas são impressionantemente marcantes, em especial as que mostram os momentos anteriores à guerra. O jovem ator Nikolai Burlyayev impressiona pela forma como modifica sua expressão facial e linguagem corporal nos dois contrapontos - enquanto nas cenas pré-guerra ele mantém uma expressão leve, um olhar inocente e movimentos livres, nas cenas de guerra, ele tem um olhar cansado, com uma expressão de ódio, fala ríspida, e seu corpo se move com dificuldade, como se ele fosse um velho exausto. Cá entre nós, não entendi a função da personagem Masha na história - ela é completamente dispensável, no meu ponto de vista (só valeu pela cena dela entre as árvores, muito bonita, por sinal). O filme toca e emociona o espectador justamente pela contraposição paz-infância/guerra-negação da infância, mas, nem de longe, choca como o igualmente russo e ótimo "Vá e Veja" (esse é um verdadeiro chute no estômago). O filme foi a estreia de Tarkovski nos longa-metragens e ganhou nada menos que o Leão de Ouro de Melhor Filme em Veneza (que estreia, hein?). Belíssima obra, recomendo com convicção.
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