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hikafigueiredo

"A Propriedade Não é Mais um Roubo", de Elio Petri, 1973

Filme do dia (124/2021) - "A Propriedade Não é Mais um Roubo", de Elio Petri, 1973 - Um jovem contador (Flavio Bucci), funcionário de um banco, revolta-se ao lhe ser negado um empréstimo. Ele demite-se e passa furtar bens de um rico açougueiro (Ugo Tognazzi), cliente do banco, pelo puro prazer de fazer alguma justiça.





Mantendo sua linha de cinema político, Elio Petri nos brinda com uma espetacular comédia de humor ácido e non sense, voltada à crítica ao capitalismo e à hiper-valorização do dinheiro e do ter em detrimento do ser. São tantos pontos cirurgicamente destacados e criticados que é até difícil lembrar de todos, mas, ressalto, especialmente, a crítica à hipocrisia do nosso "velho amigo cidadão de bem" - aquele indivíduo que alcançou posses através de condutas pouco idôneas, mas que reina, soberano, na sociedade, sob uma falsa imagem de honestidade e integridade. Esse "cidadão de bem" mescla trabalho regular com ações pouco ou nada lícitas - uma balança adulterada aqui, uma propina ali, uma sonegação acolá. A este proprietário desonesto não falta margem de crédito a juros baixos e toda a sorte de benefícios reservados à elite. No outro extremo, temos os despossuídos, os desvalidos, os pobretões, que, por mais trabalhadores e honestos que sejam, não conseguem nem crédito na vendinha da esquina, quiçá no banco em que trabalham. Inúmeras são as frases lapidares do filme, sempre muito pontuais e sarcásticas. A narrativa é ótima, tanto quanto a concepção dos personagens: o contador, ironicamente alérgico a dinheiro, desiludido com a sociedade, o capitalismo e, em última instância, com sua própria conduta honesta, revolta-se e está disposto a fazer um pouco de justiça social para si próprio - mas apenas na medida da sua necessidade. O açougueiro, por seu lado, vê em tudo uma oportunidade para ficar um pouco mais rico, ainda que às custas de terceiros e de ações ilícitas, como fraudar o seguro. O contador define-se, comicamente, como "marxista-mandrakista" (sim, sim, de Mandrake, o mágico mesmo!!), mantendo, em seu quarto, lado a lado, cartazes de seus ídolos. A narrativa é cronológica, ainda que alterne a história com os depoimentos mordazes dos personagens, em um ambiente com fundo escuro e luz direta. O ritmo é marcado e crescente. A atmosfera é bem non sense, somos o tempo todo surpreendidos pelas decisões esdrúxulas do contador. A música de Enio Morricone marca a história, com sua aura cômica. A fotografia privilegia os planos fechados e de detalhe - a fisionomia do ator Flavio Bucci, com olhos muito proeminentes, é, especialmente, aproveitada. A direção de arte é estupenda - de um lado temos o ambiente circunspecto e antigo da casa do contador (quase sentimos o cheiro de naftalina da casa), em contraposição à residência opulenta e cafona do açougueiro novo rico, que só falta colocar mármore travertino na testa. As interpretações são hilárias: Flavio Bucci tem, por si só, um rosto muito expressivo e ele abusa das caretas, com nojinho de tudo; Ugo Tognazzi é espetacular, ele interpreta seu açougueiro sem escrúpulos magistralmente. No elenco, ainda, Daria Nicolodi como a amante do açougueiro, também ótima, e Salvo Randone como o pai idoso do contador. O filme é excelente, tem um humor refinado, ultra ácido, debochado, non sense, crítico, tudo junto! Eu adorei e virei ainda mais fã do diretor!!! Não sei se é fácil de achar, mas recomendo muito!

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