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hikafigueiredo

"Caráter", de Mike van Diem, 1997

Filme do dia (186/2018) - "Caráter", de Mike van Diem, 1997 - Holanda, início do século XX. Após a estranha morte de seu pai, um poderoso oficial de justiça, Jacob (Fedja van Huêt) é detido como o suspeito de seu assassinato, oportunidade em que narra, ao delegado, sua história.





A obra - seca e austera - é quase uma metáfora do momento histórico daquela primeira metade do século XX. Sob as bençãos do sistema capitalista, temos a valoração do trabalho e do sucesso pessoal, em detrimento da saúde física e emocional do indivíduo, além do surgimento e preponderância de uma força autoritária que impulsiona esse crescimento profissional/material do ser, na figura do fascismo. O personagem Jacob. criado apenas por sua mãe fria, distante e indiferente, sente a ausência de seu pai. Se durante a infância Jacob ansiava pelo afeto desse pai ausente, ao ser rechaçado por ele, passa a medir forças com essa figura paterna. Quanto mais Dreverhaven, o pai, despreza e humilha Jacob, mais o impulsiona a ter sucesso, no sentido capitalista do termo (ou seja, mais Jacob estuda e busca seu crescimento profissional). Segue-se àquela história de que as dificuldades moldam o caráter, independente das feridas emocionais criadas no processo. Ao longo da narrativa, vemos Jacob aumentando sua desenvoltura profissional, ao mesmo tempo em que sua capacidade de se relacionar afetivamente/amorosamente com os demais vai ficando cada vez mais embotada, engessada. Ao final, a surpresa (sem spoiler) na primeira manifestação de afeto familiar vivida por Jacob, já totalmente despojado de saúde psicológica e esvaziado de sentimentos. Não é uma obra triste se o espectador ficar na superfície da história, mas, se mergulharmos no universo emocional de Jacob, diria que é um filme destruidor, de partir o coração. A narrativa se dá quase totalmente em flashback, mas seguindo a cronologia dos fatos. É um filme com ritmo moderado e constante, mas que decididamente vai agradar mais quem já está acostumado ao "timing" do cinema europeu.A obra tem uma estética pesada, uma paleta de cores tendendo ao cinza e azul, uma fotografia escura - a figura de Dreverhaven, sempre de chapéu, mantendo seu rosto na escuridão, chega a ser sinistra - e uma ambientação igualmente austera, severa, com suas construções antigas, pesadas, rígidas. Dos personagens, por mais que o protagonista principal seja Jacob, a figura de maior destaque é Dreverhaven, muito graças à interpretação de Jan Decleir. Dreverhaven é uma criatura que desperta, a um só tempo, repulsa e curiosidade, piedade e raiva, indignação e admiração. E medo, Dreverhaven desperta medo acima de tudo. O filme é tão bom que recebeu o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 1998. Filmaço. Recomendo.

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