Filme do dia (08/2021) - "Fausto", de Alexander Sokurov, 2011 - Cansado de buscar um conhecimento que lhe foge e sofrendo pela penúria financeira, Fausto (Johannes Zeiler) tenta vender um valioso anel em uma casa de penhores, cujo proprietário (Anton Alexandrowitsch Adassinski) promete-lhe satisfazer todos seus desejos em troca de sua alma.

Numa adaptação livre da obra de Goethe, o filme reconta a história de Fausto, o homem que vende sua alma ao diabo Mefistófeles em troca de conhecimento e da satisfação de seus desejos. No filme, Mefistófeles é transformado no dono de uma casa de penhores, mantendo-se sedutor e ardiloso. Já vou avisando que não é um filme fácil e palatável por conta de diálogos intermináveis de conteúdo complexo e metafórico, cujas referências, se houveram, me escaparam. Claro que o principal da obra - uma exposição acerca da decadência do espírito humano, seduzido pelo mal - é facilmente compreendido, o problema está nos detalhes. Ao longo da narrativa, "nosso" Mefistófeles conduz Fausto pela cidade, enredando-o em situações cada vez mais malignas para seu espírito - e Fausto, consciente dos perigos que o rodeiam, deixa-se levar, não sem debater (muito) as mais diversas questões. Mas, se o conteúdo dos diálogos desce um pouco "quadrado", o espetáculo visual compensa, em mil vezes, o trabalho de compreensão. A obra é visualmente belíssima, desde a ambientação até a fotografia de Bruno Delbonnel, impecável. A sensação que o espectador tem é de estar mergulhado, constantemente, em um sonho, por vezes, em um terrível pesadelo. A ambientação é sombria, escura, sufocante. A exceção fica por conta das cenas em que a personagem Margarete aparece, sempre luminosas e "fluídas". A fotografia, quase sempre em tom sépia (única exceção de que me lembro é na cena da igreja, onde a fotografia ganha tons frios, azulados), é irretocável e brinca com a percepção do espectador ao distorcer as imagens, aumentando a sensação onírica. Não são poucas as cenas que parecem verdadeiras pinturas. Destaque para a impactante cena inicial, de Fausto eviscerando um cadáver (nada fácil de olhar), para a cena da casa de banhos e para a angustiante cena no quarto de Margarete. A caracterização dos personagens é incrível, principalmente dos opostos: de um lado, o dono da casa de penhores, um ser fisicamente repulsivo, com um corpo inumano e feições de morte; de outro a angelical Margarete, com seu rosto inocente e irradiando luz e beleza. A interpretação de Johannes Zeiler como Fausto é apenas correta, pois não me transmitiu a angústia que eu esperava do personagem; Anton Alexandrowitsch Adassinski, ao contrário, não poderia estar melhor no papel, pois ele evoca tudo de demoníaco possível em um ser; e Isolda Dychauk também está perfeita como a singela Margarete. A maravilhosa Hanna Schygulla faz uma pequena ponta no filme. A obra é deslumbrante, mas um pouco cansativa pela falação constante. Assumo que gostei mais da versão de Murnau (1926), até por ter Emil Jannings como Mephisto (e ele era bom demais!!!). Ainda assim, é um Sokurov, sempre vale a pena.
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