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hikafigueiredo

"Investigação sobre um Cidadão Acima de Qualquer Suspeita", de Elio Petri, 1970

Filme do dia (122/2021) - "Investigação sobre um Cidadão Acima de Qualquer Suspeita", de Elio Petri, 1970 - O inspetor de polícia do setor de homicídios (Gian Maria Volonté) mata sua amante Augusta Terzi (Florinda Bolkan) em sua residência. Propositalmente, deixa inúmeras pistas pelo imóvel, na intenção de comprovar que é um cidadão acima de qualquer suspeita e que sairá ileso.





Pensa num filme ótimo. Agora, além de ser ótimo, pensa num filme crítico, engajado e socialmente pertinente - você acaba de chegar aqui, nesta obra. O filme - excepcional - trata de um fenômeno aparentemente mundial e bem conhecido de qualquer brasileiro consciente nos dias atuais: aquele cidadão que, por conta de algum poder do qual é investido, acredita estar acima da lei. O personagem do inspetor crê tanto na sua inatingibilidade que não basta deixar pistas pelo imóvel - ele provoca seus comandados e até confessa conhecer a vítima e ter sido dela amante para seu superior, perguntando, cinicamente, se isso poderia ser algum problema. A postura do personagem é cínica, arrogante, soberba, mas, acima de tudo, debochada - ele esboça sorrisos irônicos e zombeteiros cada vez que alguém se aproxima da verdade, mas rejeita o que deveria ser óbvio: que ele é o assassino. Sinceramente, isso me soa TÃO atual... O filme é uma evidente crítica a essa "pessoa de bem", admirada por seus pares, aplaudido por admiradores e socialmente bem colocado - e um canalha no íntimo; e não apenas no íntimo, uma vez que esfrega na cara de quem quiser que é um criminoso, mas, como na fábula do rei nu, ninguém enxerga por sob a máscara de falsa idoneidade. Uma coisa que eu acho brilhante na história, é o que motiva o assassinato da amante - o inspetor a mata porque ela zombava dele. Como vemos tão comumente na realidade, embaixo da arrogância do inspetor existia alguém com uma baixíssima autoestima, um recalcado, alguém sexualmente inseguro - inclusive há uma cena em que a vítima declara o péssimo amante que o inspetor era -, incapaz de lidar com frustrações e negativas - enfim, tudo aquilo que a gente vê nesses machinhos ofendidos que viram assassinos de mulheres. Para esconder sua insignificância como ser humano, o inspetor encastela-se em seu poder, debochando de toda aquela sociedade de quem quer se vingar. Esse filme é brilhante, um reflexo cristalino da realidade. A narrativa é não linear, alterando a cronologia das investigações, com memórias do investigador. O ritmo é moderado, mas muito adequado ao tipo de filme. A atmosfera é de indignação e incredulidade - o espectador fica em cólicas do que o inspetor faz na maior cara lavada, é aviltante. A fotografia é um pouco "lavada", sem muito contraste e saturação, muito típico da década de 70 (não sei o motivo). A obra aproveita bastante de planos próximos e planos de detalhe. A música de Enio Morricone acompanha o deboche do personagem. A figura do inspetor é interpretada por ninguém menos que Gian Maria Volonté - além de ser um ator excepcional, muitíssimo talentoso, Volonté só se comprometia com projetos de relevância político-social, que trouxesse críticas ao establishment, denúncias a desmandos ou uma visão engajada politicamente: ele era O CARA!!! E ainda era um charme (<<<< fan detected)!!!! Florinda Bolkan também está ótima como a atrevida amante Augusta! O filme é tão bom que ganhou, de uma só vez, o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro (1971) e o Prêmio da Crítica Internacional e Grande Prêmio do Júri, ambos no Festival de Cannes. Filmaço, deveria ser visto mil vezes por cada brasileiro até entrar na cabeça a relação que ele tem com a nossa realidade!!!!!

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