Filme do dia (188/2020) - "O Homem de Mármore", de Andrzej Wajda, 1977 - Agnieszka (Krystyna Janda), uma obstinada estudante de cinema, está pesquisando a história de um antigo herói do povo dos anos 50, o pedreiro Mateusz Birkut (Jerzy Radziwilowicz), para seu trabalho de conclusão de curso. Enfrentando a oposição de seu orientador, a jovem sai em busca de informações acerca do operário.
A fabulosa obra de Andrzej Wajda se desenvolve através das pesquisas da estudante Agnieszka: a história do ingênuo e idealista operário Birkut é contada através das informações angariadas pela jovem, dentre as quais fragmentos de filmes, trechos de programas jornalísticos, entrevistas. Através de uma narrativa fracionada, tomamos contato com Birkut que, ingenuamente, é alçado a herói nacional na época em que a Polônia estava sob a forte influência da URSS stalinista. Após um breve período de "lua de mel" com o governo, Birkut acaba por tomar consciência de seu papel de marionete dentro daquele regime totalitário, rebela-se e é, finalmente, engolido pelo sistema. O filme é uma evidente crítica ao governo não democrático da Polônia, discorrendo, dentre outros temas, acerca do totalitarismo, da manipulação midiática, da construção (e derrocada) dos heróis populares, da burocracia, do idealismo e do controle estatal. A obra, fortemente metalinguística, é "montada" através de inúmeros subterfúgios: temos momentos em que a história de Birkut é apresentada em forma de fragmento de filmes encontrados por Agnieszka, ou, trechos de telejornais que mencionam o operário, ou, ainda, quando a informação chega à estudante através de entrevistas, através da representação normal daquilo que é narrado. Justamente pela forma como se dá a narrativa, o tempo alterna, constantemente, presente, na forma das buscas e pesquisas de Agnieszka, e passado, na forma de trechos da trajetória de Birkut. Admirável a complexidade da edição da obra, sério. Num caso raro, a trilha sonora me chamou a atenção, alternando hinos populares (a lá Internacional Socialista) com umas músicas meio eletrônicas, bem década de 70, completamente equivocadas aos olhos (ouvidos) atuais. Fiquei absolutamente fascinada pelo ator Jerzy Radziwilowicz, que interpreta Birkut - primeiro pela sua interpretação sincera do jovem ingênuo que, paulatinamente, torna-se um homem desiludido e desesperançoso; segundo por sua beleza exótica e seu olhar expressivo. Krystyna Janda, ao contrário, tem uma interpretação, para mim, irregular - ainda que tenha momentos em que ela está realmente ótima, em outros ela exagera um pouco nas caras e bocas e ganha uma feição meio caricata, o que me incomodou um pouco. O filme é, simplesmente, excelente, irretocável original, e com um conteúdo avassalador. Adorei e recomendo demais.
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