“O Pranto de Um Ídolo”, de Lindsay Anderson, 1963
- hikafigueiredo
- 18 de abr.
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Filme do dia (28/2025) – “O Pranto de Um Ídolo”, de Lindsay Anderson, 1963 – Norte da Inglaterra, década de 1960. O minerador de carvão Frank Machin (Richard Harris) sonha em largar seu trabalho nas minas. Ambicioso, consegue um contrato em um time de rúgbi da cidade, e logo se torna um ídolo do esporte, o que não lhe garante, no entanto, uma vida feliz e satisfatória, uma vez que é rejeitado por Margareth (Rachel Roberts), a viúva que lhe aluga um quarto em sua casa.

Representante da Nouvelle Vague Britânica, movimento cinematográfico que se caracterizou por retratar de forma crua a vida brutal e as misérias das classes populares da Grã-Bretanha nos anos 1960, o filme discorre sobre o drama pessoal do personagem Frank e traça um paralelo entre sua história e a exploração dos trabalhadores pela elite burguesa – no caso, saem as minas e as fábricas e entra o esporte, onde o time funciona dentro da mesma lógica de exploração. Um olhar mais atual, entretanto, abre um outro leque de leituras e interpretações para as questões da obra – provavelmente sem sequer ter essa intenção, o diretor acabou for representar, de uma maneira bastante didática, o machismo estrutural e seus efeitos, tanto sobre as mulheres, quanto sobre os próprios homens. O ponto nevrálgico do filme é a relação de Frank com Margareth, fundada, inicialmente, em um mero contrato comercial – Margareth, viúva e sem ter como se sustentar, aluga um quarto para o minerador Frank. Com o tempo, Frank acaba se apaixonando por Margareth e, ao ser reconhecido como atleta no rúgbi, tenta de todas as formas conquistá-la. Frank, apesar de suas boas intenções, não tem qualquer sensibilidade ou traquejo para tratar Margareth e suas questões pessoais. Ele é autoritário, por vezes grosseiro, trata Margareth como propriedade, a objetifica e é incapaz de dialogar com ela. A frustração de Frank, sua solidão e seu vazio interior, aliados à sua dificuldade em expressar suas emoções e ouvir e compreender as necessidades de Margareth, logo desembocam em violência física e psicológica, o que faz a viúva se retrair cada vez mais. Perceber que é visto como um animal raivoso em um esporte marcado pela brutalidade tornam Frank ainda mais frustrado, levando-o a uma espiral de incompreensão e solidão, ao mesmo tem em que acata a exploração vinda do proprietário do time. A narrativa é não linear, pois temos idas e vindas na cronologia da história, bem como grandes elipses de tempo até pelo menos a metade do filme. O ritmo é pausado e mantém-se constante por toda a duração da obra. A atmosfera é de desalento e angústia – há, ainda, uma raiva que se acumula, fruto da incapacidade de Frank em se comunicar e aceitar a rejeição de Margareth. A fotografia P&B e o desenho de produção são hábeis em criar um ambiente de exploração e opressão constantes, seja no campo lamacento, onde os homens se agridem sob a desculpa de jogar rúgbi, seja na casa de Margareth, onde o jogo de intenções e repúdios acontece entre a viúva e o protagonista. É um filme silencioso, com poucas inserções musicais, trazendo certa aspereza à narrativa. As interpretações viscerais de Richard Harris e Rachel Roberts são marcantes – de um lado, Frank, uma bomba relógio prestes a explodir; de outro, Margareth, coberta de medo, decidida a não baixar a guarda após a morte de seu marido, cujo olhar severo por vezes revela agonia e confusão. É fato que ambos os intérpretes estão maravilhosos! Rachel Roberts foi agraciada com o prêmio BAFTA (1964), além de ser indicada ao Globo de Ouro (1964) e ao Oscar (1964), sempre na categoria de Melhor Atriz. Da mesma forma, Richard Harris foi indicado nos mesmos prêmios na categoria de Melhor Ator. O filme é excelente e foi marcante dentro do movimento da Nouvelle Vague Britânica. Disponível no Youtube e em mídia física dentro de um Box da Versátil.
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