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"O Silêncio do Mar", de Jean-Pierre Melville, 1949

  • hikafigueiredo
  • 18 de nov. de 2021
  • 3 min de leitura

Filme do dia (343/2021) - "O Silêncio do Mar", de Jean-Pierre Melville, 1949 - 1941. Em uma França dominada pelo exército alemão, o oficial germânico Werner von Ebrennac (Howard Vernon) hospeda-se na residência de um habitante de uma pequena cidade francesa. O homem e sua sobrinha aceitam a estadia do inimigo, mas recusam-se a lhe dirigir a palavra. O oficial, no entanto, obstinado, faz-se ouvir.





Primeiro longa-metragem do diretor Jean-Pierre Melville, o filme é baseado no romance homônimo de Jean Brullers, publicado clandestinamente em 1942, em plena dominação alemã da França. Na história, um oficial alemão, romântico e idealista, aloja-se na residência de um senhor de meia idade, em um pequeno vilarejo francês. O morador e sua jovem sobrinha negam-se a falar com o ocupante, que se mostra eloquente, ainda que respeitoso. Assim, dias e dias se passam sem que o homem e sua sobrinha dirijam a menor palavra ao oficial que, diariamente, profere intermináveis monólogos acerca dos mais variados assuntos. Até que uma viagem do oficial à Paris transformará sua relação com a guerra, os moradores da casa e seu próprio exército. A obra, pujante, discorre sobre idealização, perseverança, orgulho e, acima de tudo, poder. O tio e sua sobrinha franceses, ao se negarem a falar com o oficial alemão, ainda que o tolerem em sua casa, demonstram que não se rendem ao invasor. Ao rejeitarem, dia após dia, a lhe dirigir a palavra ou o olhar, acabam exercendo um intenso poder sobre o militar que, em contrapartida, exprime seu respeito e admiração pela conduta orgulhosa do idoso e sua sobrinha. Por outro lado, os longos e teimosos discursos do oficial expõem sua personalidade sensível, romântica, idealista e ética - em outras palavras, o oficial mostra-se uma pessoa cheia de princípios, a ponto de "tocar" a jovem francesa que, silenciosamente, apaixona-se pelo invasor, o qual lhe corresponde o sentimento. O silêncio, no entanto, é irrevogável. A história é narrada em "off" pelo idoso, que relembra os fatos acontecidos no passado. O ritmo é bem moroso e os acontecimentos são mínimos, limitando-se a poucas ocorrências além dos monólogos do oficial. A atmosfera é terrivelmente opressiva - a presença do oficial é ignorada e mesmo as belas palavras que ele diz são insuficientes para que o idoso e sua sobrinha desviem o olhar para ele. A obra é de uma sensibilidade impressionante - o espectador percebe o desprezo inicial se esvaindo, os afetos surgindo entre a sobrinha e o oficial, a admiração mútua que surge entre os inimigos, a grande decepção que surgirá a certa altura da história, tudo isso sem que aconteça um único diálogo entre os personagens - ao longo da narrativa, o idoso e sua sobrinha só irão proferir uma frase cada um deles. Tecnicamente, o filme tem ecos de uma estética expressionista, com uma fotografia P&B muitíssimo contrastada, com planos e posições de câmera bastante variados, sempre muito expressivos (como nos planos-detalhes dos rostos e mãos dos personagens). O elenco principal resume-se em Howard Vernom como o oficial - numa interpretação poderosa, tendo de transmitir muitas informações e emoções só com seus monólogos e expressões corporal e facial; Jean-Marie Robain como o idoso - o personagem é muito pouco expressivo, assim sua interpretação teve de ser muito contida, quase inexistente; e Nicole Stéphane como a sobrinha - a atriz teve de fazer milagre revelando emoções em movimentos mínimos... e fez isso muito bem. O filme me deixou profundamente comovida. O personagem do oficial, que poderia causar aversão, na realidade, conquista o espectador pela sua simpatia, ética e sensibilidade. O filme é ótimo, mesmo sendo bastante parado, não perdi o interesse por nenhum segundo sequer. Super recomendo.

 
 
 

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