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hikafigueiredo

"Obsessão", de Luchino Visconti, 1943

Filme do dia (222/2021) - "Obsessão", de Luchino Visconti, 1943 - O andarilho Gino (Massimo Girotti) bate à porta da carente Giovanna (Clara Calamai), que vive um casamento infeliz com Bragana (Juan de Landa). Imediatamente surge um interesse entre o sem teto e a bela mulher, mas a presença do marido torna-se um entrave para o romance.





A primeira obra do mestre Visconti foi essa adaptação não autorizada do romance "O Destino Bate à sua Porta", de James M. Cain. Considerado como um prenúncio do neo-realismo italiano, movimento que se consolidaria com o excepcional "Roma, Cidade Aberta" (1944), o filme guarda uma proximidade do movimento tanto pela estética (uso de locações reais e contraponto ao esteticismo fascista ao extrair poesia da imperfeição e pobreza), quanto pela temática (aproveitamento de assuntos controversos e um leve sopro de questões sociais, o que seria amplamente explorado posteriormente pelo neo-realismo). Apesar de ser uma obra de estreia, o filme já mostrava o talento do diretor, o que desabrocharia definitivamente em sua obra seguinte "A Terra Treme" (1948), esta completamente inserida no neo-realismo. Ainda sob o regime fascista de Mussolini, a obra trata de temas considerados escandalosos para a época como relacionamento extraconjugal, relações homoafetivas e prostituição, fazendo uso de muita tensão sexual ao longo da narrativa, inclusive entre os personagens Gino e Spaniard. A narrativa é linear em ritmo moderado, porém irregular, mormente por algumas cenas alongadas que poderiam ter sido suprimidas ou, ao menos, "enxugadas", o que tornaria a obra mais "redondinha". A fotografia P&B é marcada e crua, com planos ricos e sofisticados e alguns movimentos de câmera ousados que "passeiam" pela cena, auxiliando na formação de clima. A atmosfera é tensa e o desfecho profundamente pessimista, outro ponto que destoa demais da natural condução das obras de viés fascista, sempre grandiloquentes, otimistas e em tom "elevado". A dupla central - Clara Calamai e Massimo Girotti - estão exemplares em seus papeis. Clara Calamai impõe uma interpretação discreta, porém forte, apoiada em uma expressividade facial contida no início e bem mais evidente ao final graças ao desenrolar da trama; Massimo Girotti, por sua vez, interpreta um Gino bem mais tenso e contraditório; o personagem é complexo, bem mais "sanguíneo" que a romântica Giovanna, e o ator consegue imprimir emoções profundas ao personagem. No elenco, ainda, Juan de Landa como Bragana e Elio Marcusso como Spaniard, esse último responsável pelo sutil viés homoafetivo da obra. Ainda que a obra não seja irretocável como outras do diretor, é impressionante para uma estreia e continua sendo um grande filme para a história do cinema. Vale muitíssimo à pena e para quem se considera um cinéfilo, obrigatória. Recomendo demais!

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