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"Os Donos da Rua", de John Singleton, 1991

hikafigueiredo

Filme do dia (427/2020) - "Os Donos da Rua", de John Singleton, 1991 - Los Angeles, década de 80. Após uma desavença na escola, o menino Tre (Desi Arnez Hines II) é enviado, por sua mãe Reva (Angela Bassett), para a casa de seu pai Furious (Laurence Fishburne), onde ele passa a morar. Sete anos depois, ainda sob orientação de seu pai, Tre (Cuba Gooding Jr.) prepara-se para entrar na faculdade, enquanto seus amigos de infância encontram-se envolvidos em problemas pessoais e crimes.





Com roteiro e direção de John Singleton, a obra traz a crua realidade dos bairros de periferia de Los Angeles, habitado majoritariamente pela população negra. O filme acompanha a juventude do personagem Tre, o qual, através da orientação dos seus pais, tenta ser um ponto fora da curva e escapar de um destino aparentemente inevitável: o envolvimento com drogas e crimes que levam à morte precoce dos jovens negros destes bairros. Lógico que a discussão, na realidade, concentra-se no racismo estrutural, aquele que permeia toda a sociedade e que tem raízes profundas que alcançam até mesmo os próprios negros - exemplificado pelo policial que não se assume como fazendo parte daquela realidade, muito embora pertença ao mesmo grupo étnico. O filme, bastante didático, mostra como a própria sociedade, da maneira como é estabelecida, incumbe-se de reproduzir, indefinidamente, as condições para que o problema da violência contra a população negra se perpetue, ressaltando que essa violência, muitas vezes, parte de dentro do próprio grupo, com jovens negros assassinando outros jovens negros , enquanto o establishment branco observa sem nada fazer (ou, pelo contrário, fomentando essa situação). Não sei se era intenção do diretor, mas o filme escancara outra questão identitária - o machismo para lá de arraigado na nossa sociedade, ainda mais presente se considerarmos a realidade das mulheres negras (daí a necessidade de uma discussão que leve em conta tanto o gênero quanto a cor da pele). Toda a discussão da obra é para lá de válida, principalmente se considerarmos que o diretor vivenciou essa realidade "de dentro", isto é, com lugar de fala. Também vale ressaltar que John Singleton tornou-se um marco ao ser o mais jovem diretor a ser indicado ao Oscar de Direção pelo filme - fato ainda mais notável se considerarmos a questão dele ser negro e, até hoje, a comunidade negra estar lutando por seu reconhecimento dentro da Academia. A obra é excelente, embora, na minha opinião, falte-lhe certa sutileza - tudo é muito, MUITO didático, inclusive com uma explanação bastante pedagógica de Laurence Fishburne (se bem que isto é bastante comum no cinema norte-americano; o público de lá, aparentemente, só entende se for tudo m.u.i.t.o. b.e.m. e.x.p.l.i.c.a.d.i.n.h.o...). Também acho que o filme teve alguns pequenos deslizes - eu achei a trilha sonora sofrível (e olhe que eu não sou de perceber muito isso), com uns tecladinhos mega cafonas com cara de churrascaria de interior; a única cena de sexo que tem no filme seguiu a mesma linha brega, completamente desnecessária, inclusive para o andar da carruagem; e, formalmente, achei um pouco convencional demais - a obra, bacana, merecia ser um pouco mais arrojada nesse sentido. Quanto ao elenco, destaque total para Laurence Fishburne como Furious, pai de Tre, uma ilha de segurança e resiliência em um mar de conflito e caos; Cuba Gooding Jr., muito jovem, ainda estava longe de ser o ótimo ator que é hoje, mas não chega a fazer feio. O filme ainda traz Angela Bassett, Regina King e Ice Cube, dentre outros. É uma obra forte, sanguínea e emocionante. Eu gostei e recomendo.

 
 
 

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