- hikafigueiredo
"Um Limite Entre Nós", de Denzel Washington, 2016
Filme do dia (177/2018) - "Um Limite Entre Nós", de Denzel Washington, 2016 - EUA, década de 50. Troy Maxson (Denzel Washington) é um homem de 53 anos, casado com Rose (Viola Davis) e pai de dois rapazes - Lyons (Russell Hornsby), fruto de um relacionamento anterior de Troy, e Cory (Jovan Adepo) - com quem tem um relacionamento conflituoso. Frustrado por não ter chegado ao sucesso como jogador de baseball, Troy sobrevive exercendo a função de lixeiro e comanda a família com firmeza. Um evento abalará a relação familiar.

Adaptado da peça homônima de August Wilson, o filme trata de conflitos familiares à luz das dificuldades causadas pelo racismo e pelo momento histórico em que ocorre. Mas, o que mais me chamou a atenção na obra - e duvido que este fosse o cerne, mas é absolutamente impossível me despojar da minha condição de mulher do século XXI - foi a sombra do patriarcado sobre aquela relação retratada na história. Se num primeiro momento Troy parece ser um sujeito bacana, amoroso com a esposa e provocador com os filhos, aos poucos ele se revela amargo, tirânico e egoísta, despejando sobre todos o fel de sua frustração causada, não pelo racismo, como gosta de sustentar, mas por conta de outras limitações suas. Okay, eu sei que o momento histórico em que a narrativa se dá acatava aqueles comportamentos masculino e feminino - o primeiro, quase ditatorial, e, o segundo, manso e subserviente - mas é extremamente irritante ver o machismo de Troy entranhado na vida e nas relações interpessoais, estragando tudo, passando feito um rolo compressor sobre os sentimentos da esposa e dos filhos, preocupado muito mais com si do que com qualquer outro, ao mesmo tempo em que a mulher tudo aguenta e tudo suporta, sem jamais se levantar contra essa opressão. Não sei se a intenção do autor foi a de criar um personagem contraditório, que apesar de duro com os seus, queria apenas o bem da família e blá blá blá, mas eu não engulo a imagem do "bom tirano" e esse papo de "filho da puta com boas intenções" não me convence. No final das contas, acabei detestando o personagem Troy e me irritando ao infinito com o que vi no filme (inclusive com a personagem Rose). À parte o conteúdo da narrativa, o filme não consegue esconder, por um só segundo, sua origem teatral - a câmera parece engessada e os enquadramentos, extremamente convencionais, e mesmo com a ação se passando, na maior parte do tempo, no quintal fora da casa da família, em ambiente aberto, tive a sensação de opressão e claustrofobia (por mais estranho que isso possa parecer). Na real, o que segura o filme, são as atuações magníficas de Denzel Washington e Viola Davis, dois monstros sagrados da arte de interpretar - todo o rancor e as contradições de Troy exalam dos poros do ator, assim como Viola consegue explorar o sofrimento mudo, a dor contida, misturados com a adoração que Rose demonstrava pelo marido. Por sua atuação, Viola Davis foi agraciada com o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante em 2017 (só discordo da categoria... coadjuvante "my ass", tinha de ser na categoria principal!!!!). Ótimo filme com interpretações inspiradíssimas, a despeito do ranço machista que me irritou profundamente. Recomendo com as devidas ressalvas.