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“Um Vazio no Meu Coração”, de Lukas Moodysson, 2004

hikafigueiredo

Filme do dia (115/2024) – “Um Vazio no Meu Coração”, de Lukas Moodysson, 2004 – Em um minúsculo apartamento na Suécia, o jovem Eric (Björn Almroth) tenta sobreviver à sua difícil existência trancado em seu quarto, enquanto seu pai Rickard (Thorsten Flinck) grava um filme pornô amador com Tess (Sanna Brading) e Geko (Goran Marjanovic) na sala ao lado.




 

Perturbador e indigesto, o filme faz uma crítica à sociedade, enquanto explora os limites do espectador e, possivelmente, dos próprios atores envolvidos. Tratando de temas tão variados quanto a violência de gênero, o abuso moral, físico e sexual de crianças, a busca por fama (não importando os meios), a indústria da medicina estética, o armamentismo e o relacionamento familiar, a obra é uma enorme viagem às feridas internas dos personagens, ao vazio existencial, aos medos ancestrais e à necessidade de extravasar toda essa bagagem patológica para tentar sobreviver. A narrativa acompanha quatro personagens numa descida sem escalas para o inferno, que tanto pode ser o próprio, quanto o do outro. A interação entre os personagens perpassa o sexo e a violência e, com exceção de Eric, todos aceitam diversas formas de degradação, por vezes autoimpostas. Na história, Eric é um jovem adolescente que mora com o pai em um minúsculo apartamento na Suécia. Tendo perdido a mãe ainda na infância e vitimado por uma deficiência física congênita, Eric se protege da natureza autodestrutiva do pai trancando-se em seu quarto e evitando qualquer contato humano. Apesar de viver em um ambiente para lá de nocivo, Eric consegue manter sua humanidade e parece ser o único dos personagens a perceber o caráter doentio da conduta dos demais personagens. Rickard, o perturbado pai de Eric, produz filmes pornográficos amadores na sala de sua casa, sem qualquer profissionalismo. Geko é o ator do filme, que apresenta um comportamento violento e claramente misógino. Tess é a jovem atriz, cujo sonho de infância é ser famosa, custe o que custar, e extremamente permissiva quanto aos abusos que sofre naquele ambiente. Ao longo de um dia, os quatro personagens vão conviver e vivenciar uma escalada de violência com objetivo catártico, chegando a revelações que mudarão as vidas dos envolvidos. Aviso muito sério àqueles que tiverem vontade de assistir: o filme é extremamente violento – mas não aquela violência slasher; é violência psicológica e real, principalmente de gênero – e muito escatológico, com cenas que podem ferir estômagos mais sensíveis. É o puro suco da degradação humana e exposição de dores, medos e fraquezas extremos. Como se o teor do filme não fosse suficientemente agressivo, a linguagem cinematográfica utilizada também é – a câmera está quase permanentemente “na mão”, levando a imagens tremidas e enquadramentos “sujos”, bem como a movimentos de câmera quase aleatórios e pouco planejados; a iluminação parece ser natural, então é uma fotografia escura, sem brilho ou contraste, que, aliada ao desenho de produção propositalmente deprimente (um apartamento sujo, largado e “apertado”), desperta claustrofobia e um severo mal-estar no espectador. O filme traz depoimentos dos personagens e finge cenas documentais, além de trazer cenas reais de cirurgias bem invasivas, difíceis de assistir para quem tem aflição, como eu. Ainda que tenha uma trilha musical, ela é usada com moderação e são infinitas as passagens silenciosas, com apenas os sons ambientes e os diálogos. Quanto ao elenco, devo dizer que todos são heroicos por passar por tudo aquilo sem desistir, em especial a atriz Sanna Brading, a mais severamente violentada pela história. Pessoal, é um filme muito pesado, muito doentio e que pode afetar, por meio de gatilhos, os espectadores mais sensíveis. Para quem assistiu a “Para Sempre, Lilya” (2002), do mesmo diretor, sabe o quanto ele pode criar histórias perturbadoras. Peço bom senso aos pretendentes a público. Eu, que gosto de filmes transgressores (desde que não envolvam crianças ou animais), gostei bastante e fiquei super impactada. Lógico que o Justwatch nem reconheceu o filme... Só disponível em torrent ou mídia física.

 
 
 

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