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hikafigueiredo

"A Casa que Jack Construiu", de Lars von Trier, 2018

Filme do dia (249/2018) - "A Casa que Jack Construiu", de Lars von Trier, 2018 - Jack (Matt Dillon) é aparentemente um sujeito comum, sem nada que o destaque dentre seus pares. No entanto, sob a aparência banal, esconde um terrível serial killer, cujas façanhas são placidamente narradas ao poeta Virgílio (Bruno Ganz) quando da descida do assassino ao inferno.





É fato notório que a maior diversão do diretor Lars von Trier é chocar, ou, no mínimo, incomodar, o espectador. Neste filme, ele não foge à regra. Mas, aqui, o incômodo surge menos da experiência "slasher", já que existem filmes com cenas infinitamente mais sangrentas que as retratadas na obra, do que da narrativa que acompanha as imagens e que discorrem, basicamente, acerca do Mal, em sua mais pura concepção. Não existe, no caso, qualquer paixão, desejo ou outra emoção que justifique as mortes promovidas por Jack - não, o personagem é tomado de total frieza e desprovido de qualquer empatia por quem quer que seja. Ele é, tão somente, a personificação do Mal, aliado a uma boa dose de orgulho, arrogância e deboche. Partindo disso, temos uma longa explanação acerca do Mal e da pulsão pela morte, inclusive relacionando ambos com a arte. Quem espera muita ação, vai se decepcionar, pois a obra apoia-se muito mais nas explicações que o personagem dá acerca de sua conduta do que nas cenas de morte em si (que, evidentemente, existem, mas são quase subsidiárias do texto). A estrutura narrativa lembra demais aquela traçada em "Ninfomaníaca" - como Joe, personagem de Charlotte Gainsbourg, Jack também relata, com detalhes, seus feitos a terceiro - eu, particularmente, não curti a retomada da mesma estrutura, tive uma certa sensação de ideia requentada. Outra coisa que me decepcionou no filme - eu, fã assumidíssima do diretor -, foi que, diferentemente do restante das obras de Trier, só consegui absorver a narrativa enquanto objeto intelectual, ou seja, para mim, o filme passou ao largo do terreno sensorial - e isso foi doloridíssimo de perceber, pois o que sempre mais me impactou nos filmes do diretor foi percebê-los no campo das emoções, sempre com uma carga pesadíssima de sentimentos e sensações (para meu profundo deleite), o que não aconteceu nesse filme. Não vou dizer que o filme não seja bom ou que eu não tenha gostado - o filme é ótimo e eu curti, mas faltou envolvimento emocional para mim. Como também é de se esperar, não é filme para todos - há que se querer embarcar na viagem intelectual do diretor, inclusive no que tange à descida ao inferno, e pude ver, através dos amigos que foram comigo, nenhum dos quais grande aficcionado em filmes "de arte" ("filmes cabeça" ou seja lá como quiserem chamar), que simplesmente odiaram a obra (e sequer conseguiram acreditar quando eu disse que eu havia gostado). Achei interessante o "abandono" das eternas protagonistas femininas e a forma como Trier "abraçou" seu personagem Jack e admiro o trabalho que ele conseguiu extrair do Matt Dillon, um ator que estava para lá de esquecido (e que eu nunca consegui achar grande coisa) - Matt Dillon está perfeito como Jack, com seu olhar gélido que lhe dá certa cara de maluco. Destaque ainda para Bruno Ganz como Virgilio, Riley Keough como Simple e para a trilha sonora com a música do David Bowie. Grande filme, mas não para muitas pessoas.

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