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  • hikafigueiredo

"Atirem no Pianista", de François Truffaut, 1960

Filme do dia (116/2020) - "Atirem no Pianista", de François Truffaut, 1960 - Charlie Kohler (Charles Aznavour) é o pianista de um boteco, tímido e solitário. Ele guarda um segredo - na verdade ele é um pianista virtuose que abandonou tudo após uma tragédia. No entanto, há quem saiba de sua história. E bem próximo a ele.





O filme é uma obra menos conhecida do diretor e, na minha opinião, menos apaixonante que "Os Incompreendidos" (1959), "Uma Mulher para Dois" (1962), "Farenheit 451" (1966) e, evidentemente, "A Noite Americana" (1973). A obra é, prioritariamente, um drama, mas ele flerta com os filmes noir e tem alguns leves toques de comédia. Acompanhamos um excerto da vida de Charlie - ele é um virtuose no piano, mas sua personalidade insegura e tímida o impediu, por anos, de alcançar uma carreira artística. Um evento o leva ao estrelato, mas uma tragédia o faz abandonar tudo e permanecer incógnito em um bar desimportante. Paralelo a isso, Charlie é vítima de dois indivíduos que estão ao encalço de seu irmão mais velho. A narrativa mescla a vida pessoal de Charlie com a perseguição pelos homens desconhecidos, mas algo permeia toda a história - a figura frágil, fraca e insegura do protagonista. Em dado momento ele assume que tem medo... em outro, ele assume sua timidez. É através de toda a sua fraqueza que acompanhamos os eventos de sua vida, tantos os eventos felizes, românticos, quanto as ocorrências violentas ou dramáticas. Charlie é um indivíduo impotente face à vida e sua indecisão o leva a condutas que ajudam a transformar sua existência em algo vazio, solitário e sem sentido. Há uma melancolia aliada a certa amargura que perpassa toda a narrativa e que faz com que o espectador sinta piedade pelo protagonista. Ele é, essencialmente, um pobre diabo. A narrativa avança linear e cronologicamente até um grande flashback que nos revela quem é Charlie e que ocorrências fizeram sua vida ir do nada ao sucesso e, subitamente, retornar ao ostracismo, oportunidade em que entendemos de onde surge a tristeza aparentemente intrínseca ao personagem. Correndo por fora do drama, temos o conteúdo "gangsterístico" (sim, eu inventei essa palavra) da história, que ajuda a criar certa tensão e aumenta - bastante - o ritmo da narrativa. Truffaut - gênio que era - consegue amalgamar essas duas facetas do filme de uma maneira incrível, sem que a obra pareça dividida em duas partes desconexas. Algo que me incomodou - uma imagem da mulher machista e preconceituosa, revelada em alguns diálogos que, nos dias de hoje, causariam dor de barriga em qualquer garota. O filme conta com uma fotografia P&B pouco contrastada, às vezes até meio "flua", e uma trilha sonora agradável, ainda que não consiga defini-la muito bem. Charles Aznavour - que, cá entre nós, era um grande músico, não ator - saiu-se bastante bem como Charlie, talvez, justamente, por ser um personagem um tanto inexpressivo. Marie Dubois interpreta a forte e decidida Léna, quase a antítese de Charlie e Nicole Berger a angustiada Thérèse. O filme é uma mostra de como Truffaut era bom mesmo quando não não fazia obras exuberantes. Recomendo (mas sem o mesmo ardor de "A Noite Americana").

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