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hikafigueiredo

"Diário de uma Garota Perdida", de Georg Wilhelm Pabst, 1929

Filme do dia (172/2020) - "Diário de uma Garota Perdida", de Georg Wilhelm Pabst, 1929 - Após ser abusada por um funcionário da farmácia de seu pai, a inocente Thymian (Louise Brooks) engravida, dando início ao seu martírio pessoal.





O filme, baseado no romance homônimo de Margarete Böhme, é um drama com um pé no melodrama que, à época de seu lançamento, foi tremendamente criticado por seu conteúdo escandaloso. Moralismo besta. Embora exista sim muito conteúdo sexual, tudo é muito sutil, apenas sugerido, nada é explícito e tenho para mim que a crítica tinha, na realidade, outro motivo (esse foi o alegado), que incomodaria muito mais os "cidadãos de bem" daquele tempo - a exposição escancarada da condição feminina sob uma sociedade machista e patriarcal. Temos praticamente todas as questões ligadas à condição feminina no filme: o poder patriarcal, o aborto feito clandestinamente, a diferença no tratamento de homens e mulheres no que se refere à conduta sexual, o abuso, o estupro, as poucas possibilidades de trabalho oferecidas para as mulheres, a sororidade. A obra é riquíssima na abordagem a estas questões e deixa evidente quão difícil era ser mulher naquela época (não só naquela época, né não?). Não vou destrinchar cada um dos itens acima para não dar spoilers que estragariam a experiência de quem for assistir, mas queria falar de pelo menos um deles: a sororidade. Para quem não sabe, sororidade é a capacidade das mulheres terem empatia umas pelas outras e se apoiarem mutuamente. No filme temos dois extremos - a total ausência de sororidade na relação de Meta com Thymian e, no seu polo oposto, a completa sororidade de Thymian pela sua irmã menor e por Erika. Aparentemente, a protagonista possuía uma compreensão meio intuitiva da importância das mulheres se apoiarem umas às outras e levava isso como máxima de vida. Pode ser até que uma das cenas que envolve o tema seja pouco crível (a cena de Thymian e a irmãzinha), mas, ainda assim, ela é uma linda cena de sororidade e eu fiquei dividida entre surtar e me emocionar.... Saindo um pouco do conteúdo, o roteiro é muito bem amarrado, tem um ritmo constante e segue em tempo linear. Logicamente, a fotografia é P&B, bem marcada, como era de se esperar de um filme do Expressionismo Alemão. O filme ainda não é falado e a trilha sonora que o acompanha é vívida e marca com vigor cada ação dentro das cenas. Mas vamos ao que, para mim, é a cereja do bolo da obra: as interpretações. Como protagonista temos a maravilhosa (gente... eu amo essa mulher!!!) Louise Brooks! Lousie Brooks encarnou como talvez nenhuma outra atriz antes ou depois dela a "inocente sensual". A atriz tem um quê de Capitu, que, por mais que ela interprete uma moça ingênua, instiga os demais personagens, ela exala sensualidade, mas não uma sensualidade vulgar, é algo sutil, nas entrelinhas... sei lá, não sei explicar. O olhar dela é de quem implora por algo e o sorriso é aberto, doce!!! Lousie Brooks, ainda, tem uma interpretação pouco teatral, mais natural do que era comum naquela época. Cara... ela é demais. Mas não tem só ela de ótima na obra. Fritz Rasp interpreta Meinert, o funcionário que abusa de Thymian (isso não é spoiler... acontece nos primeiros dez minutos de filme), a imagem do macho escroto, simplesmente asqueroso, muito bem interpretado pelo ator; Valeska Gert como diretora do reformatório é explicitamente sádica e cruel, outra grande atuação; Franziska Kinzas também está estupenda como Meta - que olhar gélido é aquele? E Josef Rovenski também está horroroso como pai da protagonista. Olha... o elenco está de parabéns. Destaques... a cena do jantar no reformatório, bem como a cena da ginástica; a cena de Thymian e sua irmã; o "reencontro" de Thymian e seu pai. Okay... a fala final é meio pieguinhas... mas não deixa de ser verdade. Grande filme. Amei!!! Tão bom quanto "A Caixa de Pandora" (1929) do mesmo diretor e dobradinha com Louise Brooks. Recomendo muito.

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