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hikafigueiredo

"O Homem que Vendeu sua Pele", de Kaouther Ben Hania, 2020.

Filme do dia (294/2021) - "O Homem que Vendeu sua Pele", de Kaouther Ben Hania, 2020. Síria, 2011. Às vésperas da eclosão da guerra civil no país, Sam (Yahya Mahayni) e Abeer (Dea Liane) formam um casal apaixonado. Por uma conduta impulsiva e imprudente, Sam é preso e, conseguindo fugir da prisão, acaba tendo de se exilar no país vizinho Líbano, deixando para trás a namorada. A guerra eclode e Sam torna-se um refugiado, enquanto Abeer se casa com um funcionário da Embaixada Síria na Bélgica e se muda para aquele país. Desesperado, Sam conhece o artista plástico Jeffrey Godefroy (Koen De Bouw) que lhe faz uma ousada proposta que lhe possibilitaria viajar para a tão sonhada Bélgica.





Inspirado pela história real de Tim Steiner, que teve suas costas tatuada pelo artista plástico belga Wim Delvoye, tornando-se, assim, uma obra de arte viva, o filme abre inúmeras discussões acerca de diversos temas, tais como os limites éticos da arte, a arte como mercadoria, a transformação do ser humano em mercadoria, a falta de perspectiva de um (ou vários) povo(s), o drama vivido pelos refugiados de guerras, a condição feminina nos países de religião islâmica, a desumanização das pessoas em situação de risco, o preconceito para com as pessoas de origem árabe, dentre outros tantos possíveis. É essa capacidade para estimular discussões que torna a obra tão interessante e que me motiva a recomendá-lo. Há, no entanto, um porém - o mesmo filme que instiga discussões é aquele que não desenvolve, a fundo, as questões propostas. Assim, os temas abordados permanecem superficiais e, por vezes, assumem perspectivas otimistas irreais. A narrativa é circular e o ritmo bem marcado. A atmosfera do filme é curiosamente leve, mesmo quando aborda temáticas sérias e pesadas e acredito que foi para manter essa leveza que a diretora não buscou um aprofundamento dos temas. O roteiro mostrou-se bem engendrado, desenvolve-se bem, mas tenho de dizer que o desfecho deixou a desejar - como não gosto de dar spoiler, limito-me a afirmar que o desfecho não é nada plausível, sendo muito mais concebível o final alternativo que é sugerido (quem assistir ao filme entenderá). Se a obra ousa nos assuntos, ela permanece bastante convencional na forma - senti falta de uma linguagem um pouco mais autoral, algum distanciamento da forma tradicional, o que não aconteceu. Evidentemente, a ausência de uma forma mais autoral não faz com que o filme seja ruim, mas me faz ter a sensação de que a obra perdeu parte de sua potencialidade. Destaco, aqui, o trabalho do elenco - Dea Liane está bem como a Abeer, assim como Koen De Bouw, como Godefroy, mas, quem se destaca é Yahya Mahayni como Sam - o ator impõe um personagem intenso, confuso, por vezes contraditório, e, definitivamente, sob forte pressão. Quem também merece destaque é a maravilhosa Monica Bellucci como Soraya, quase irreconhecível pelos cabelos loiros, mas reconhecível pelo chame e talento. O filme foi um dos indicados ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2021 e Yahya Mahayni recebeu o Prêmio de Melhor Ator na Seção Horizontes do Festival de Veneza. O filme me envolveu profundamente e o vejo como um fomentador de boas discussões. Minha maior crítica a ele fica por conta do posicionamento leve e otimista que ele assume, mas que, também, não estraga a experiência. Eu gostei e recomendo.

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