Filme do dia (09/2023) - "Tár", de Todd Field, 2022 - A maestrina Lydia Tár (Cate Blanchett) encontra-se no auge de sua carreira ao comandar a Sinfônica de Berlim e lançar um livro sobre sua trajetória. No entanto, seu comportamento pouco adequado poderá lhe trazer problemas em relação aos seus pares.
Fui ao cinema para ver esse filme com a sede de uma fã incondicional da atriz Cate Blanchett. Ledo equívoco. Claro que a interpretação de Blanchett é incrível e carrega o filme nas costas, mas, o decorrer da narrativa jogou uma piscina de água fria no meu ânimo exaltado. Mas vamos por partes. O filme vai acompanhar desde o auge da artista Tár até sua derrocada, decorrente de seus próprios atos e de sua personalidade narcisista ao extremo. No início da história somos apresentados à maestrina e compositora Lýdia Tár. Ela se encontra no ápice de sua carreira, é respeitada, admirada e aplaudida no estrito métier dos músicos clássicos, estando à frente da Sinfônica de Berlim. Lésbica assumida, Tár mantém uma relação sólida com a colega de orquestra Sharon Goodnow, a primeira violinista da sinfônica. Gradativamente, no entanto, começamos a estranhar algumas atitudes da maestrina que, aos poucos, revela um caráter duvidoso e estabelece relações abusivas com seus comandados, colegas e esposa. Esse comportamento inadequado irá se acirrar, dando espaço a uma descida ao inferno para a artista. A ideia é ótima, admito, mas, na minha leitura, o desenvolvimento da narrativa encontra uma série considerável de problemas. Vamos a eles: primeiro, o filme começa lento, lentíssimo. Demora uma vida e mais meia hora para a obra "situar" a protagonista, evidenciando seu autocontrole, seu profundo conhecimento de música, seu elán, sua sofisticação, e por aí vai. Quando finalmente solidifica a imagem icônica de Tár, o filme começa a desconstrução dessa figura poderosa e convicta da personagem. Essa desconstrução tem início bem v-a-g-a-r-o-s-a-m-e-n-t-e, com a personagem sendo assombrada por seus fantasmas internos e pelas consequências de suas atitudes, mas, do nada, no último terço do filme, a queda se acelera num ritmo vertiginoso e a controlada Tár do início da narrativa dá lugar a uma ... louca! A mudança da protagonista ocorre de forma tão abrupta e exagerada que perde qualquer verossimilhança! A cena da apresentação da orquestra é absolutamente despropositada e, para mim, a história perdeu o fio da meada aí. Esse, para mim, é o grande problema da obra, mas não o único. O início do filme me pareceu extremamente hermético, com discussões longas e intermináveis sobre detalhes de partituras e apresentações, algo que um leigo da música - meu caso - ficará longe de entender, gerando um tanto de desinteresse no espectador. Também achei o comportamento da personagem um tanto quanto masculinizado - é evidente que existem mulheres abusivas e, também, com comportamentos predatórios, mas o tipo de assédio que ela praticava me pareceu tão... masculino, tão pouco próximo do universo feminino, que me soou um pouco preconceituoso quanto a orientação sexual da personagem, reconhecidamente lésbica. Talvez seja viagem minha, mas eu achei que o roteiro pesou um pouco a mão nessa nuance masculina de Tár. No final das contas, reconheço o filme como irregular, com partes melhores e piores e um desenvolvimento pouco sólido. Percebi, também, alguns trechos que nada contribuem para o roteiro, como, por exemplo, as cenas de Tár treinando e correndo - se tirar essas cenas na obra, não muda nada! A narrativa é linear, em ritmo lento até o terço final, momento do plot twist pouco convincente. A atmosfera começa sofisticada, esnobe e hermética, parte para uma atmosfera de angústia e temor e termina... escrachada, por falta de palavra melhor para usar. Claro que, por sua própria natureza, é um filme bastante "auditivo", com muitas informações sonoras. Gostei do design de produção que acompanha a queda da personagem. Mas, vamos combinar, o filme é uma vitrine para Cate Blanchett desfilar seu talento e ela faz isso com extrema facilidade. As cenas dela regendo são incríveis, a força de sua expressão facial é impressionante. Cate Blanchett é sempre fabulosa e insistir nessa informação é até bobo. No elenco, ainda, Nina Hoss como a esposa de Tár, Sharon, também muito bem; Noémie Merlant interpreta Francesca, a braço direito de Tár e uma das principais vítimas de sua manipulação e arrogância; Sophie Kauer interpreta a violoncelista Olga. Gostei de ver o tamanho do elenco feminino!!!! O filme e Cate Blanchett foram indicados para um sem número de premiações, do Oscar (2023) ao Leão de Veneza (2022), passando pelo Critics' Choice Awards (2023) e Globo de Ouro (2023), nas categorias de Melhor Filme e Melhor Atriz. Informação importante e sincera - achei a obra arrastada a ponto de ter olhado algumas vezes no celular para ver quanto tempo faltava para o fim e isso não é bom sinal. Apesar das virtudes - a principal, a presença de Blanchett - acho que, no fundo, eu não curti o filme não. Veja para assistir ao trabalho da atriz. O resto é por sua conta e risco.
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