Filme do dia (37/2024) – “A Primeira Profecia”, de Arkasha Stevenson, 2024 – Roma, 1971. A noviça Margaret (Nell Tiger Free) chega à cidade trazida pelo Cardeal Lawrence (Bill Nighy) para fazer ali seus votos. Trabalhando em um orfanato, ela conhece Carlita (Nicole Sorace), uma jovem de quatorze anos que sofre com terríveis alucinações e, ao tentar ajudá-la, Margaret se envolve em uma tenebrosa conspiração para trazer o mal à Terra.
Já comentei antes que aqueles que, como eu, adoram filmes de terror, estão sempre passíveis de se depararem com filmes, no mínimo, questionáveis. Vez ou outra aparecem filmes notáveis, como “Os Inocentes” (1961), “O Bebê de Rosemary” (1968), “O Exorcista” (1973), “Poltergeist” (1982), “O Sexto Sentido” (1999), ou, mais recentemente, “A Bruxa” (2015), “Corra!” (2017), “Hereditário” (2018) ou “Midsommar” (2019), só para citar os mais famosos, mas, no frigir dos ovos, quando se trata de cinema de terror, é bem comum perdermos tempo com obras fracas, quando não péssimas. Dentre os filmes singulares, “A Profecia” (1976) ocupa um lugar induvidoso. O sucesso destes filmes notáveis, por outro lado, abre espaço para que diretores, nem sempre muito inspirados, tenham a infeliz ideia de fazerem continuações – e, mais recentemente, prelúdios, no mais das vezes tirados sabe-se lá de onde. Com muita sorte, os prelúdios (ou prequels) resultam em filmes tão bons quanto os originais – temos os exemplos de “Os que Chegam com a Noite” (1971), prequel de “Os Inocentes” e que conta com ninguém menos que Marlon Brando no elenco, ou, atualmente, “Pearl” (2022), prequel de “X – A Marca da Morte” (2022), melhor até que o filme anterior (se bem que, nesse último caso, o diretor já havia concebido o prelúdio desde o lançamento do primeiro filme). Fato é, no entanto, que a chance destes filmes posteriores ou anteriores a grandes obras serem um grande equívoco é enorme. E aí chegamos neste filme aqui, “A Primeira Profecia”, prequel da obra “A Profecia”. Então... minha humilde opinião é que a diretora tem potencial para fazer um ótimo filme do gênero terror sem precisar apelar para um gancho com uma obra notável, porque ela consegue imprimir uma tensão bem bacana na história. No entanto, por ter preferido fazer um filme ligado a outro, ela acabou ficando presa num enredo e, para mim, pisou na bola bonito. Começamos pela premissa – um grupo de religiosos que, para fortalecer a Igreja Católica, opta por trazer o mal para esta dimensão, criando, assim, um oponente. Gente, desculpa, mas achei tão furada essa premissa, tão sem nexo! Não duvido da sanha pelo poder de grupos religiosos diversos, mas essa sede de poder é algo terreno demais para que tais grupos apelassem para alguma coisa do além. Para mim, esse enredo beira o ridículo, melhor seria assumir a existência de um grupo maligno dentro da Igreja pronto a adorar o coisa ruim e ponto, sem essa de teoria da conspiração!!! Além do enredo mambembe, o filme simplesmente ignora pontos da obra original – a origem de Damien em “A Profecia” está muito bem explicada, tendo, o pai adotivo, encontrado o túmulo de sua genitora, cena das mais impactantes do filme (sem spoilers) e que aqui é sumariamente ignorada. Quer criar prequel? Okay, crie, mas RESPEITE o enredo original, pelamor! Se ignorarmos se tratar de um prelúdio, o filme se sustenta um pouco melhor, mas, ainda assim, temos alguns pontos questionáveis, como a premissa já mencionada, ou a cena da morte de uma das freiras, completamente dispensável para o andamento da história, existindo ali apenas para criar uma cena de impacto. Os desenhos de Carlita, que poderiam ser sutis, extremamente explícitos: desnecessário, poderiam ajudar a fazer um clima mais tenso mostrando menos; o orfanato, à noite, ser iluminado por velas em plena Roma dos anos 70 é ridículo também, faltou bom senso. E, finalmente, a diretora não se decidiu se queria fazer um filme de terror psicológico ou de “jumpscare” e o resultado ficou no meio do caminho. Agora que eu descasquei o filme um monte, vou falar do que gostei... achei a interpretação da maior parte do elenco bem boa, com destaque para Nell Tiger Free (a cena do acidente em que ela “se transforma” é bem forte, gostei do trabalho dela), para nossa queria Sônia Braga como Irmã Silva e para Nicole Sorace como Carlita. Achei, no geral, o desenho de produção de época bem satisfatório (tirando a história da iluminação do orfanato por velas). E, como mencionei lá em cima, achei que a diretora criou, sim, um clima de tensão sólido, que segura, em parte a obra. Enfim, não é um filme realmente bom, mas, comparados a outros muitos, não chega a ser péssimo ou desprezível. Em todo caso, prefiro esperar o filme “MaXXXine” (2024) e, quem sabe, recomendar este como um bom filme de terror! rs
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