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  • hikafigueiredo

"Alemanha, Ano Zero", de Roberto Rosellini, 1948

Filme do dia (414/2020) - "Alemanha, Ano Zero", de Roberto Rosellini, 1948. Berlim, 1947. Em uma cidade devastada pela guerra recém-finda, vaga o jovem Edmund (Edmund Moeschke), um menino de 12 anos que busca conseguir algum dinheiro para ajudar no sustento de sua família e de seu pai gravemente enfermo.





Integrante do Neorrealismo Italiano, a obra retrata a dura realidade da Alemanha no pós-guerra, mostrando a triste condição em que se encontrava o povo alemão, outrora orgulhoso, agora humilhado e sobrevivendo sem qualquer perspectiva de amanhã. Filmado numa real cidade em escombros - raras são as construções em condições mínimas de habitação -, a obra é a imagem da desesperança e da desilusão: a população sobrevivente, como formigas em um formigueiro recém destruído, vagando, a esmo, sem destino, tendo, como única meta, garantir o mínimo para resistir a mais um dia de fome. Em uma situação de absoluta penúria, os sentimentos mais baixos e egoístas afloram aqui e ali - valendo a lei da sobrevivência, não existe compaixão ou empatia que resistam, ainda que frente a crianças, idosos ou enfermos. Com tudo isso em vista, a narrativa acompanha o dia-a-dia de Edmund, um menino de 12 anos, magro e franzino, que, diariamente, sai em busca de sustento para sua família. O menino é rechaçado das frentes de trabalho pela pouca idade, envolve-se com jovens marginalizados, é explorado por adultos conhecidos e mostra-se órfão de orientação e acolhimento, ainda que presente o afeto do pai enfermo. A figura de um antigo professor - evidentemente alinhado com as concepções e os ideais nazistas - trará ainda mais confusão ao menino completamente perdido naquele universo destruído. O personagem do professor, aliás, até mereceria uma discussão mais aprofundada, pois óbvio que ali está como representação de tudo o que era mais nefasto na extrema-direita que assolou a Alemanha, levando-a "do céu ao inferno" em poucos anos, mas, evitemos os spoilers. A narrativa é linear e abarca o período de dois ou três dias na vida do garoto. O ritmo é moderado e constante, e a atmosfera é de absoluto desalento, o sentimento de uma não-vida, a insistência em manter-se vivo por hábito, posto inexistirem sonhos ou objetivos a serem alcançados. Como integrante do Neorrealismo Italiano, o filme tem uma postura severamente crítica e um evidente engajamento político contrário ao fascismo e tem, como objeto, a realidade das classes sociais mais humildes, dos trabalhadores e daqueles à margem da sociedade. Formalmente, também seguindo o Neorrealismo, a obra utiliza locações reais, retrata a população verdadeira daquele espaço geográfico e se aproxima da linguagem jornalística, fazendo uso de muita "câmera na mão". A fotografia P&B é bastante natural, bem granulada e, por vezes, muito contrastada, com uma luz "dura" quando em ambiente interno. Os atores, muito dos quais amadores, saem-se muito bem, cumprindo seu papel, com destaque para o menino Edmund Moeschke, que parte até o mais rígido coração de pedra que exista por aí; Ernst Pittschau como o pai (este ator profissional, com longa carreira no cinema alemão); e Erich Gühne como o odioso professor. Aviso aos navegantes: o tom pessimista, aliado a diversos gatilhos existentes no filme - que vão de pedofilia a suicídio -, recomendam que pessoas sugestionáveis, com histórico relacionado a abusos, depressão ou pensamentos suicidas, evitem a obra. Para os demais, recomendo fortemente o filme.

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