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"Alemanha no Outono", de Rainer Werner Fassbinder, Hans Peter Cloos, Alexander Kluge, Peter Schubert

hikafigueiredo

Filme do dia (321/2021) - "Alemanha no Outono", de Rainer Werner Fassbinder, Hans Peter Cloos, Alexander Kluge, Peter Schubert e outros, 1978 - Entre 1977 e 1978, a RAF, extrema esquerda alemã, foi autora de uma série de atentados terroristas no país. O documentário trata das consequências destes atentados sob a ótica de onze cineastas alemães.





O documentário em questão discorre sobre um evento trágico e suas repercussões - em 1977, um grupo de extrema esquerda alemã (RAF, também conhecido como Grupo Baader-Meinhof) foi responsável pelo sequestro de um avião e, particularmente, do empresário Hanns-Martin Schleyer, o qual acabou sendo assassinado no cativeiro. Após isto, três membros do grupo, os quais estavam detidos em uma prisão de segurança máxima, surgiram mortos em suas celas, sob a explicação oficial de que haviam cometido suicídio, muito embora as circunstâncias de suas mortes mostrassem-se muito suspeitas, em especial pela utilização de uma arma de fogo que dificilmente teria entrado no cárcere pelas mãos do grupo. A partir destes eventos, onze diretores de cinema alemães teceram considerações acerca de questões político-sociais na Alemanha Ocidental daquele momento. São capítulos autônomos e sem relação entre si que tratam de temas como o clima político da Alemanha Ocidental daquela época, visões sobre autoritarismo versus democracia, reação do povo aos atos terroristas e ao "suicídio" dos membros do grupo terrorista, flexibilização de leis, relativização de ações autoritárias do estado, interpretação histórica de fatos, violência e terrorismo de estado, imperialismo e fascismo. O documentário mostra-se uma grande colcha de retalhos, pois cada diretor deu sua interpretação dos fatos, centrando seu "capítulo" em algum aspectos da questão. Há capítulos que tratam objetivamente dos fatos, tratando de pessoas públicas (que eu desconheço) e suas reações aos eventos, utilizando, para tal, imagens reais da época ou de épocas anteriores; há capítulos, por outro lado, em que situações são encenadas com o uso de atores que surgem como personagens ligados aos fatos; há um capítulo, muito interessante por sinal, em que Fassbinder interpreta-se a si mesmo dialogando com pessoas de sua convivência (sua mãe, seu companheiro, sua ex-esposa) acerca dos eventos, expondo, de maneira visceral, sua interpretação da questão (ainda que Fassbinder apresente-se como Fassbinder, é evidente que existe uma roteirização de suas ações); outro capítulo muito interessante é o que traça uma relação entre a peça grega Antígona e o momento da Alemanha (este capítulo, alegórico, apoia-se em metáforas para tratar da questão do autoritarismo e censura com muita ironia e é um dos melhores momentos do filme); também vale a pena destacar o último capítulo que trata da desumanização dos terroristas que, tratados com desprezo pela população geral, quase forma impedidos de serem sepultados, a demonstrar a perda de empatia e humanidade de todos os envolvidos. O documentário, embora interessantíssimo até mesmo para quem não conhece o assunto com profundidade, mostra-se um pouco caótico e sem unidade. As inúmeras abordagens, completamente desconectadas entre si, fazem com que a experiência de assistir à obra mostre-se um pouco truncada, acontecendo em pulos. Além disso há momentos de absoluta entrega do diretor (com destaque no capítulo de Fassbinder) e outros em que o responsável se mantém quase neutro (como no capítulo sobre o velório de Schleyer, momento completamente "frio" do filme). Impossível esmiuçar as características de cada capítulo, tamanha as diferenças entre elas. Costurando tudo, uma trilha sonora desigual, que vai de peça de Mozart a Joan Baez e Ennio Morricone. Único ponto de consenso: qualquer violência, independente de quem parta (terroristas ou estado), deve cessar. A obra é muito curiosa, original e criativa. Evidentemente teve passagens melhores e piores, mas me manteve interessada durante quase todo o seu tempo de duração. Eu gostei e recomendo.

 
 
 

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