Filme do dia (59/2024) – “Amargo Reencontro”, de John Milius, 1978 – Califórnia, 1962. Um grupo de jovens, dentre os quais os amigos Matt (Jan-Michael Vincent), Jack (William Katt) e Leroy (Gary Busey), passam os dias em incursões à praia local onde praticam surfe e noitadas agitadas regadas a álcool e confusões. Os anos se passam e cada um segue seu caminho, mantendo, no entanto, laços ligados ao esporte.
Continuando minha visita a algumas obras notórias da Nova Hollywood, chego a este filme que celebra, antes de tudo, a amizade, mas que também discorre sobre sonhos, aspirações e desilusões da juventude dos anos 60 e 70. Diferentemente de outros filmes do movimento, a obra é mais sutil em suas críticas à sociedade e ao sistema, caracterizando-se por ser bem mais intimista, refletindo questões pessoais do diretor. A história acompanha cerca de dez anos da vida de três amigos surfistas (e mais alguns agregados), desde a tenra juventude, momento de descontração e irresponsabilidade, até a vida adulta, quando seus caminhos já não seguem tão paralelos e as obrigações de diversas naturezas cobram uma postura mais madura de cada um deles. O filme, assim, trata do processo de amadurecimento inevitável da vida adulta e das mudanças que o tempo promove nos anseios da juventude. A narrativa é linear, passando por quatro momentos cronológicos diversos (anos 1962, 1965, 1968 e 1974), cada qual relacionado a um tipo de onda do mar encontrado nas diferentes estações do ano naquele ponto geográfico específico. O ritmo é lento para um filme hollywoodiano, com momentos de maior agilidade. Há uma narração em off que não fica bem claro a quem pertence, mas que certamente seria de alguém do grupo. A atmosfera inicial é descontraída, mas a cada minuto torna-se um pouco mais pesada e melancólica, muito embora o título em português, completamente equivocado, pese muito a mão nesse clima negativo e sugira algo que não se concretiza (não sei se tentaram fazer uma ligação com o filme “Amargo Regresso”, também de 1978, e infinitamente mais pesado e deprimente que esta obra) – o sentimento que resta é certa saudade de um tempo passado, dos sonhos abandonados e daqueles amigos que se perderam pelo caminho. O roteiro é hábil em marcar a mudança da adolescência para a vida adulta, mas tenho algumas críticas: a primeira é que os jovens retratados parecem um bando de incivilizados – eles não precisavam ser tão grosseiros, violentos e desrespeitosos para que sua irresponsabilidade e irreverência ficassem evidentes, achei muito exagerada a caracterização; segunda crítica fica por conta do período da Guerra do Vietnã – é claro que existe uma referência ao conflito, várias cenas que mencionam a guerra, mas ela é retratada de uma maneira excessivamente distante; o diretor poderia ter aproveitado para fazer uma crítica mais direta ao belicismo, ao envio de tantos jovens para o front, mas não, ele praticamente não se posiciona e isso para mim é bem discutível – artista que não se posiciona em relação aos assuntos controversos não está fazendo valer uma das funções da arte, que é promover a discussão crítica e o amadurecimento de ideias. A terceira crítica fica por conta de um manejo meio esquisito do clímax – a cena foi estendida desnecessariamente e ela sofre uma ou duas pequenas interrupções, sei lá, causou certo estranhamento em mim. Por outro lado, inegável que o filme traz incríveis cenas de surf, não devendo nada para alguns documentários sobre o esporte – para quem gosta de esportes de ação, é um prato cheio. Aliás, quem já fez parte de algum nicho de esporte ou atividade, com certeza vai reconhecer o sentimento de saudade e melancolia que o filme desperta (só vivenciando mesmo para entender). Formalmente, o filme é mais convencional do que a média das obras do movimento – ele não é tão cru, a fotografia é bem tradicional e a trilha sonora “amacia” muito as cenas. O elenco não traz nomes muito conhecidos – Jan-Michael Vincent interpreta o surfista Matt, um ícone entre seu grupo; Gary Busey interpreta o tresloucado Leroy e William Katt, o responsável Jack (o último ficou conhecido do público através do seriado “Super-herói Americano”, que fez sucesso no início dos anos 80). Todos estão bem em seus papeis, mas nada muito excepcional. Curiosidades: dentre os amigos surfistas podemos ver o ator Robert Englund, que anos mais tarde ficaria marcado como o personagem Freddie Krugger; o filme, ainda, celebra o surfista Gerry Lopez, que interpreta a si própria na obra; parte das cenas foram dubladas por surfistas renomados da época. O filme é bem bacana e me passou esse sentimento de pertencimento e melancolia que eu mencionei logo acima. Curti e recomendo. Segundo o Justwatch, o filme está para alugar no Amazon, no AppleTV, no Youtube e no Google Play Movies (não está disponível em streaming comum).
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