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“Bird”, Andrea Arnold, 2024

  • hikafigueiredo
  • 5 de out.
  • 3 min de leitura

 

Filme do dia (77/2025) – “Bird”, Andrea Arnold, 2024 – Bailey (Nykiya Adams) é uma garota de 12 anos que mora com o pai, “Bug” (Barry Keoghan), e o meio-irmão mais velho, Hunter (Jason Buda). Ela se revolta quando o pai anuncia que irá se casar com a nova namorada, Kayleigh (Frankie Box) e vai procurar acolhimento em meio aos amigos mais velhos. Certo dia, ela conhece o estranho Bird (Franz Rogowski), o qual está em busca de sua família, despertando a curiosidade de Bailey, que passa a ajudá-lo.


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O Reino Unido adora filmes sobre a desestruturação da sociedade, especialmente se o foco forem as classes menos favorecidas e, nessa linha, encontramos um número considerável de obras, tais como “A Solidão de uma Corrida Sem Fim” (1962), “Kes” (1969), “Trainspotting” (1996), “Ou Tudo ou Nada” (1997), “Eu, Daniel Blake” (2016), “Você Não Estava Aqui” (2019), dentre outros tantos. Em “Bird”, observamos a vida desregrada da protagonista “Bailey”, de 12 anos, nos subúrbios de Kent. Fruto de uma relação casual, Bailey mora com seu pai “Bug” e seu meio-irmão Hunter, de 16 anos, num imóvel ocupado em um bairro decadente. O entorno de Bailey é caótico, sujo, feio e miserável. O pai, desempregado, busca formas nada tradicionais de ganhar algum dinheiro, enquanto planeja seu casamento com sua nova namorada. O irmão, Hunter, acaba de criar, com amigos, uma gangue para fazer justiça com as próprias mãos. A mãe vive uma relação abusiva com um homem violento, administrando outras três filhas pequenas além de Bailey. À jovem menina só resta sobreviver ao mundo que parece só existir para machucá-la e marginalizá-la. O filme mistura denúncia social com realismo mágico enquanto acompanha Bailey amadurecendo à força em meio esta existência insalubre. Mas, ainda que não faça grandes concessões, a obra acena com detalhes que são suficientes para manter Bailey em pé e lutando – o novo amigo Bird pode não ser um herói, mas talvez concorra para algumas soluções; Bug está longe de ser um pai ideal, mas pode ser acolhedor e não esconde seu afeto genuíno pelos filhos; e as pequenas irmãs da protagonista podem ser a motivação necessária para ela resistir. Ao longo da narrativa iremos ver mudanças significativas em Bailey, a demonstrar que a vida tem diferentes nuances e que vale a pena aproveitar seus bons momentos. Destaques: achei emblemática a relação de Bailey com seu celular – ele é companhia, ele registra seus sonhos e pode ser até uma arma que a proteja. Gostei também de como a narrativa desenvolveu a amizade entre Bailey e Bird – ela acontece com naturalidade, equilibrando a curiosidade da menina com sua resistência a demonstrar sentimentos. Também curti a forma como aprofundaram um pouco o personagem Bug – se por muito tempo ele é mostrado como um adulto irresponsável, um completo “outsider”, a cena da estação de trem vem revelar toda a sua humanidade e como ele pode ser a pessoa certa dentro daquela realidade crua dos filhos. Destaco a opção pelo realismo fantástico já pelo final da obra – a transformação alegórica que culmina na transformação real da protagonista. Por fim, destaco a trilha sonora que consegue colocar no mesmo balaio música punk, Blur, The Verve e até Coldplay sem ficar estranho ou fora de contexto. Vou reclamar de algumas cenas noturnas que ficaram escuras demais e não deu para acompanhar a ação direito. Quanto às interpretações, Nykiya Adams tem a capacidade de transmitir todo aquele caldo emocional interior de Bailey sem transbordar para o exterior – a personagem é dura na queda, não exprime suas fraquezas, não expõe seus sentimentos, mas deixa evidente seus afetos, a existência de sonhos profundos e uma resiliência rara: ótimo trabalho da atriz mirim, cujo único senão é não parecer, nem aqui, nem na China, que tem só 12 anos (e o pior é que ela tinha mesmo essa idade!!!). Falar de Barry Keoghan, para mim, é abrir as portas para o meu lado mais tiete – eu sou fanzaça dele, adoro seu trabalho e foi exatamente a minha motivação para ver esse filme. Ele é um ótimo ator, mas confesso que gosto mais dele em personagens mais controversos e estranhos – sua interpretação foi a ótima, mas o personagem Bug pouco exigiu dele. Quanto a Franz Rogowski, ele traz para o personagem Bird a mistura necessária de estranheza e carência, apresentando um excelente trabalho de atuação – Bird se revela aos poucos, o espectador fica esperando uma reação que não vem, vem outra coisa, achei excelente. O filme concorreu à Palma de Ouro em Cannes (2024), sendo suplantado por “Anora” (2024). Eu gostei bastante e recomendo. Em streaming pelo MUBI.

 
 
 

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