Filme do dia (65/2023) – “Bye Bye Brazil”, de Carlos Diegues, 1979 – Em meio ao sertão nordestino, os artistas circenses Lorde Cigano (José Wilker), Salomé (Betty Faria) e Andorinha (Príncipe Nabor) formam a Caravana Rolidei e pulam, de cidade em cidade, atrás de sua sobrevivência. Em um pequeno vilarejo, juntam-se a eles o acordeonista Ciço (Fábio Júnior) e sua esposa Dasdô (Zaira Zambelli) e passam a desbravar o país junto com a caravana.
Eu simplesmente ADORO esse filme e não me canso de assisti-lo!!! Adoro a forma como ele tem camadas e consegue discorrer sobre assuntos tão diversos, alguns universais, outros profundamente nacionais. O filme é tratado como uma comédia, mas eu o considero um “road movie” dramático com alguns alívios cômicos. A característica mais marcante da obra é que ela fala sobre um país em rápida transformação e expõe abertamente o projeto desenvolvimentista que marcou o Brasil entre as décadas de 1950 e 1980. Através das viagens da Caravana Rolidei, o espectador vai descobrindo diferentes porções do país, cada qual sentindo, de uma forma diversa, os efeitos das políticas econômicas dos governos. Assim, o filme retrata inúmeros “marcos” das políticas desenvolvimentistas – a Transamazônica, A Zona Franca de Manaus, a exploração de minérios no Norte do país, Brasília – e, junto com eles, tudo de ruim que veio a reboque – o desmatamento da Floresta Amazônica, o extermínio dos povos originários, a exploração sexual nos confins do país, o empobrecimento cultural, a americanização, dentre outros. A obra é um verdadeiro tratado histórico-geográfico e é riquíssimo em questões para serem discutidas, desde seu aspecto físico (como as diferentes paisagens geográficas e tipos de vegetações), até seu aspecto humano (como a expulsão das populações tradicionais do campo para a cidade ou o crescimento desenfreado das metrópoles). Paralelamente a esse conteúdo histórico-geográfico, o filme traz alguns dramas humanos universais – as paixões dos personagens, sua sexualidade, sua necessidade de sobrevivência. Temos, também, um pequeno retrato do patriarcado, da submissão da mulher pelo homem, nas figuras trágicas de Salomé, explorada por Lorde Cigano, e de Dasdô, esposa de Ciço, obediente e sem qualquer voz. A obra tem detalhes que não acabam mais e eu a indicaria como um ótimo objeto para a sala de aula. O roteiro é amarradíssimo e desenvolve-se com uma naturalidade única. Temos diálogos ótimos, principalmente os protagonizados pelo personagem Lorde Cigano, possuidor de um humor ágil e ferino. Não vou mentir: tecnicamente o filme mostra-se um pouco aquém das obras estrangeiras da mesma época – a fotografia com cores um pouco “desmaiadas” e o som um pouco “sujo” (percebi, em algumas cenas, ruídos que dificultaram o entendimento dos diálogos) são problemáticos, mas nem de longe maculam a obra, que é fantástica. A trilha musical tem a música título de Chico Buarque – o que já valeria a visita – além de músicas de Dominguinhos, Ari Barroso, The Fevers, Genival Lacerda e até Frank Sinatra! O elenco traz José Wilker, fenomenal como o esperto Lorde Cigano, Betty Faria como a sedutora Salomé, Fábio Júnior como o retirante Ciço e Zaira Zambelli como a ingênua Dasdô – todos estão ótimos, a direção de elenco não poderia ser melhor. Temos algumas “pontas” com gente do calibre de Jofre Soares, Marieta Severo e Carlos Kroeber. O filme foi indicado à Palma de Ouro em Cannes (1980), mas, infelizmente, não a levou. Independente de qualquer coisa, é um FILMAÇO OBRIGATÓRIO!!!! Se ainda não o viu, veja!!!!
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