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hikafigueiredo

"Casa Grande", de Fellipe Gamarano Barbosa, 2015

Filme do dia (223/2016) - "Casa Grande", de Fellipe Gamarano Barbosa, 2015 - Jean (Thales Cavalcanti) é um jovem de classe média alta do Rio de Janeiro. Morando em uma mansão na Barra da Tijuca, estudando no tradicional Colégio São Bento (para a nata da sociedade carioca), Jean vive em uma "bolha", onde seu único contato com a vida real é através dos empregados domésticos da casa. A família, na realidade está falida, mas os pais Hugo (Marcelo Novaes) e Sônia (Suzana Pires) tentam esconder esse fato dos filhos e dos amigos. A demissão do motorista Severino desperta, em Jean, questionamentos acerca da realidade em que está inserido.





Esqueçam "A que Horas ela volta?", "Casa Grande" discute exatamente as mesmas questões, mas com muito mais competência e sutileza.Temos, nesta obra, uma mostra pontual do pensamento da nossa classe média endinheirada, com seus preconceitos, discursos feitos e muita, mas muita hipocrisia. São tantas questões delicadamente colocadas que é até difícil abordar todas. Hugo, o pai, vive de aplicações financeiras - vive à toa pela casa, aparentemente nunca pegou no pesado, mas mantém o discurso da meritocracia e de como "se fez sozinho". Sônia, a mãe, vive de forma meio deslumbrada - para não dar pinta de que está precisando de dinheiro, dá aulas de francês (por sinal ela fica falando em francês nas refeições, mas só porque ela é sofisticada...) e, quando a necessidade aperta, passa a vender cosméticos às amigas endinheiradas, mas sempre dando ideia de que é um mero hobby, ela não precisa daquilo, afinal trabalhar é para pobre. Natalie, a filha, furta dinheiro dos pais e faz chantagem com o irmão, deixando bem claro o seu caráter. E Jean... Jean é um menino bacana, mas que, imerso naquele universo preconceituoso e cínico, acaba, por vezes, assumindo o mesmo discurso vazio e hipócrita do pai. A fala dissonante na história fica por conta de Luiza (Bruna Amaya), namorada de Jean, que, descendentes de negros e estudante do colégio público Dom Pedro I, defende as políticas de inclusão, as cotas raciais e os mecanismos que visam diminuir as contradições e diferenças de oportunidades. É um excepcional filme que discute o fosso existente entre a elite e o povão - destacando que o lado "mais popular" é bem mais verdadeiro no que se refere a afetos e atitudes (talvez resida certo romantismo por parte do diretor nesta ideia, em todo caso....). O filme é muito bem construído, mas com uma linguagem cinematográfica bastante tradicional e tempo linear. As questões são, na maior parte das vezes, colocadas de forma sutil, não escancarada, de forma que, talvez, algumas pessoas vejam tudo com naturalidade e não consigam captar a crítica intrínseca. Ressalto os ótimos diálogos, muito verossímeis. Os atores, muitos dos quais iniciantes e amadores, dão conta do recado. O jovem Thales Cavalcanti se sai muito bem como o menino com dúvidas e questionamentos e evidentemente deslocado, tanto na realidade como em seu próprio corpo. Bruna Amaya consegue transmitir toda a força e energia de Luíza, menina decidida e com forte consciência política. Marcelo Novaes e Suzana Pires também estavam ótimos com aquela arrogância sutil de quem acredita, de verdade, ser de uma "casta" superior. Adorei, ainda, a estreante Clarissa Pinheiro como a empregada Rita, confidente de Jean. Também merece destaque o ótimo tema musical do filme (e olha que é difícil eu perceber isso). Filme bom, bom pacarai, adorei e recomendo muito.

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