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“Cinema Jazireh”, de Gözde Kural, 2025

  • hikafigueiredo
  • há 10 horas
  • 3 min de leitura

Filme do dia (88/2025) – “Cinema Jazireh”, de Gözde Kural, 2025 – Após sobreviver ao massacre de sua família, Leila (Fereshteh Hosseini) busca, desesperadamente, seu filho Omid, desaparecido. Submetida aos rigores do Talibã, Leila resolve disfarçar-se de homem para ter autonomia em sua busca, uma alternativa arriscada e potencialmente fatal.


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O filme garante uma breve visão do inferno sobre a Terra ao retratar, com crueza perturbadora, o regime do Talibã no interior do Afeganistão. Na história, Leila é uma mãe desesperada que procura o filho de sete anos, desaparecido. Ocorre que, sob as regras do Talibã, mulheres não podem sair de casa, exceto se acompanhadas de seus maridos ou parentes do gênero masculino. Leila arrisca-se a sair sozinha, uma vez que seu marido foi assassinado pelo próprio Talibã e ela se encontra desamparada no mundo, mas, rapidamente, é interceptada por homens do regime, que a repreendem, castigam e exigem que retorne para casa. Impossibilitada de fazer qualquer coisa e tolhida na sua liberdade de locomoção, Leila toma uma decisão arriscada – disfarçar-se de homem para continuar sua busca. A mensagem da obra é clara: o mundo não é um lugar certo, justo e seguro para mulheres e crianças, estejam onde estiverem. O domínio masculino é, invariavelmente, cruel com aqueles que não são seus iguais e, independente do regime e das regras sociais, culturais e religiosas impostas, o dinheiro e o poder sempre dão a tônica – aos homens endinheirados, tudo é permitido. Outra constatação evidente, é que as sociedades humanas são, intrinsecamente, hipócritas – regras morais e imposições religiosas são defendidas às claras, mas, às escusas, nenhuma delas resiste aos ímpetos egoístas e animalescos das pessoas, especialmente, dos homens. A última questão verificada é que regimes religiosos são, sempre, problemáticos e, nesse sentido, a existência do Talibã é uma verdadeira excrescência no mundo, pois violento, desumano, abjeto e, claro, fanático. Duas coisas me chocaram no filme: a destruição completa das estruturas físicas da sociedade – casas, ruas, escolas, absolutamente tudo, encontra-se destruído. Mas o que o filme mostra não é a devastação promovida por bombardeios – isso, infelizmente, já nos é costumeiro de ver. O que temos aqui é a ruída promovida diretamente por pessoas – as casas encontram-se reviradas, tudo, dentro, propositalmente quebrado, assim como as escolas, reduzidas a escombros de mesas e papeis. E pensar que toda essa destruição foi promovida, uma a uma, conscientemente, por alguém que acreditou que arrasar tudo era, de alguma forma, benéfico. A segunda coisa que me chocou foi a completa ausência de mulheres no filme, nas ruas, na vida daquele lugar. O apagamento feminino foi tão completo que elas deixaram de existir no ambiente social – o único momento em que vemos uma mulher – o único momento em que vemos uma mulher na sociedade, é Leila, devidamente vestida de burca, sendo castigada apenas por existir e estar ali. Gente, que pesadelo é esse? Tudo o que posso dizer é que o filme e o que ele retrata é sombrio, assustador e cinzento e mesmo as mensagens de esperança que a obra reverbera parecem inúteis e inalcançáveis. A narrativa é completamente linear, em ritmo muito lento. A atmosfera é de desalento e desesperança, uma angústia sólida por saber que tudo aquilo existe hoje e agora. Confesso  que achei a obra um pouco cansativa – os acontecimentos são poucos, o ritmo muito lento, lembrou o cinema iraniano, mas sem a mesma poesia. Quanto ao trabalho de Feresteh Hosseini como Leila é suficiente, mas nada extraordinário, até porque o papel exige uma descrição que a impede de demonstrar maiores dotes de atriz. Nhééé, o filme traz informações interessantes, mas desconfio que, em dias, terei esquecido até de seu nome. Terceiro filme assistido na 49ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.

 
 
 

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