Filme do dia (324/2021) - "Domingo Maldito", de John Schlesinger, 1971 - Alex (Glenda Jackson) e o médico Daniel (Peter Finch) vivem um triângulo amoroso, dividindo o jovem amante Bob (Murray Head). Um sabe do outro, muito embora não se conheçam pessoalmente, e aceitam a situação pouco cômoda por medo de perder o rapaz. Em um determinado domingo, no entanto, tudo poderá mudar.
Se na época do lançamento do filme o que mais chamava a atenção e causava polêmica na história era o relacionamento homossexual entre o médico Daniel e o artista plástico Bob, para mim, quarenta anos depois da produção cinematográfica em questão, o que salta aos olhos é a falta de responsabilidade emocional do personagem Bob. Veja bem, eu não tenho uma posição conservadora acerca de relacionamentos - não vejo qualquer problema em quem assume relações abertas, vive um trisal, ou opta por não se fixar em ninguém -, mas a situação retratada no filme está muito distante de qualquer destes casos. Ainda que o personagem Bob alegasse que não impingia o triângulo amoroso aos amantes, é evidente, ao longo da narrativa, que ele se aproveitava da paixão e da dependência emocional de Alex e de Daniel para impor a presença de um ao outro e vice-versa. No filme, ambos evidenciam o desconforto com a situação, enquanto Bob "fazia a egípcia", ignorando o sentimento dos dois amantes. O desfecho (sem spoiler) deixa ainda mais claro o desrespeito de Bob pelos sentimentos alheios, fossem de Alex ou de Daniel. Posto isto, para mim, na minha leitura de século XXI, a obra trata de relacionamentos tóxicos e responsabilidade emocional (algo que, certamente, nem passou pela cabeça da roteirista Penelope Gilliatt e do diretor Schlesinger rs). A narrativa é linear, em um ritmo moroso e esquisito - não é que o filme seja exatamente lento... para mim, ele não fluiu como deveria, ele me pareceu "travado", mas pode ser uma leitura muito particular da obra. A atmosfera é de incômodo, de um mal-estar contido, dissimulado. A ousadia da obra fixou-se no tema e, óbvio, das cenas de amor entre Daniel e Bob, que, na época, devem ter causado algum desconforto nas terras da rainha Elizabeth. No que tange à linguagem cinematográfica, mesmo com laivos autorais, mostrou-se mais convencional. Se algo merece destaque são as interpretações do elenco. O pobre Murray Head, mesmo sem fazer feio como Bob, ficou imprensado entre dois monstros da interpretação, que engoliram qualquer momento mais inspirado do jovem ator. Glenda Jackson, perfeita como Alex, deixa transparecer toda a dor da personagem de ter de dividir o amante, impondo uma expressão facial cerrada e tensa - por seu trabalho, foi agraciada com o prêmio BAFTA (1972) de Melhor Atriz, além de ter sido indicada ao Oscar (1972) e ao Globo de Ouro (1972) na mesma categoria; Peter Finch, por sua vez, estraçalha como o médico Daniel - não tem nem o que falar do ator, né, ele era fabuloso, tendo recebido o BAFTA de Melhor Ator no mesmo ano, bem como as mesmas indicações de Glenda Jackson, na categoria Melhor Ator. O filme foi agraciado com o BAFTA de Melhor Filme e o Globo de Ouro de Melhor Filme Estrangeiro. Mesmo vendo méritos na obra, em especial o de derrubar antigos preconceitos quanto a relacionamentos não-heteronormativos, eu tenho de confessar que ela não funcionou muito bem para mim não. Eu senti o filme arrastado, lá pelas tantas me bateu um sonão e tive de lutar muito para manter os olhos abertos, mesmo com o show de interpretação de Finch e Jackson. Não vou dizer para não assistirem a ele, mas deixo um alerta que não é filme unânime. PS - a história do cachorro não me desceu. Fiquei putaça com a reação dos personagens e acho que isso até influenciou na minha opinião sobre o filme.
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