- hikafigueiredo
"Eu Tu Eles", de Andrucha Waddington, 2000
Filme do dia (404/2020) - "Eu Tu Eles", de Andrucha Waddington, 2000 - Darlene (Regina Casé) despede-se de sua mãe e, grávida, vai à igreja para se casar. O noivo e pai da criança, no entanto, não aparece. Darlene abandona sua pequena cidade no agreste e só retorna depois de três anos, com seu filho a tiracolo. Logo que chega à sua cidade, é pedida em casamento por Osias (Lima Duarte), bem mais velho que ela. Darlene aceita, mas logo descobre que a vida de casada com Osias não é fácil, o que levará a moça buscar alternativas.

O filme, baseado num caso real ocorrido no Nordeste, narra a história de uma situação de poliafetividade envolvendo a personagem Darlene, seu marido Osias e outros dois homens. Sem fazer qualquer alarde e, muito menos, sem levantar qualquer bandeira , Darlene acaba envolvida com três homens, vivendo todos sob o mesmo teto e em relativa harmonia - relativa porque, muito embora tenham surgido ciúmes, a conveniência acabou por manter todos, resignados, em seus respectivos "quadrados". O roteiro foi construído bem meticulosamente - como cada relação se estabeleceu é contado com cuidado, sem pressa. Os personagens são consistentes, as situações, ainda que inusitadas, fazem sentido, tudo se encaixa com relativa lógica e "lastro", seja este no campo afetivo, seja no financeiro, seja, simplesmente, quanto à "logística" da família. Certo é que cada personagem garantiu uma função dentro daquela grande família, que acabou funcionando como um sistema bem engrenado. A narrativa é linear, com algumas elipses temporais. O ritmo é moderado, apenas o necessário para "cimentar" a situação de cada relação nova que se estabelece. A atmosfera é agradável e carrega certa sedução. Atenção: o filme pode até parecer uma comédia - inclusive foi assim classificado - mas está mais para um drama leve, pois é dessas obras que não arrancam riso, mas deixam um sorriso gostoso no rosto do espectador. O filme tem uma fotografia belíssima, com cores sempre muito saturadas e aproveitando a luminosidade natural do sertão nordestino - aquele céu ultra azul, sem nuvens, a terra avermelhada - e usando, com frequência, planos abertos para evidenciar a desolação do local. A trilha sonora foi assinada "apenas" por Gilberto Gil, garantia de qualidade absoluta. O elenco só tem gente de talento: Regina Casé está muito bem como a sertaneja Darlene, uma personagem de personalidade forte que, embora não fale duro, nem exija coisas, faz por onde conseguir o que quer; Lima Duarte interpreta Osias, um homem mais velho, autoritário, mas acomodado, que faz de tudo para não precisar fazer nada (rs); Stênio Garcia interpreta Zezinho, um homem afetuoso, prendado, dado às coisas do lar; e Luiz Carlos Vasconcelos interpreta Ciro, homem jovem, viril, por quem Darlene, rapidamente, sente-se atraída. Eu diria que é um filme todo "good vibes", aconchegante. Eu gostei demais e recomendo com carinho.