Filme do dia (113/2023) – “Invasores de Corpos”, de Philip Kaufman, 1978 – O agente sanitário Matthew Bennell (Donald Sutherland) ouve de sua melhor amiga Elizabeth (Brooke Adams) que o marido dela não é mais, na realidade, o marido dela. Ela alega que um impostor teria tomado o lugar dele, levando Matthew a acreditar que a amiga está paranoica. Quando outros amigos e conhecidos passam a fazer o mesmo comentário sobre seus parentes, Matthew como a acreditar que algo muito sério está acometendo a cidade de São Francisco.
Nessa ótima refilmagem de “Vampiros de Almas”, mantemos, com algumas poucas modificações, as linhas gerais do clássico de 1956. No entanto, o momento histórico era outro, bem diferente daquele do filme original, de forma que esta obra perdeu completamente seu teor metafórico quanto ao seu conteúdo. Eu me explico: os anos 50/60 foram o auge da Guerra Fria e da paranoia norte-americana/mundial acerca do “perigo vermelho”. Na época, grande parte dos filmes de ficção científica – e não só eles – remetiam, de maneira sutil ou escancarada, ao receio da “ameaça exterior”, uma metáfora evidente dos medos mais profundos relacionados ao comunismo e a uma guerra nuclear que lhe vinha a reboque, logicamente inculcados nas cabecinhas mais frágeis (e ocas) da população geral. Seguindo essa linha, “Vampiros de Almas” é um reflexo claro desta paranoia que se disseminou naquela época. “Invasores de Corpos’, por outro lado, aparece em um momento de certa distensão entre as grandes potências, quando a Guerra Fria e a ameaça nuclear já não tiravam tanto o sono dos habitantes do planeta, motivo pelo qual a obra esvaziou-se do seu significado original. Ainda que esse esgotamento tenha retirado do filme profundidade, tornando sua leitura bem menos espessa e interessante, a obra permaneceu sendo um filme de entretenimento muitíssimo acima da média, uma ficção científica capaz de envolver qualquer espectador. A narrativa é linear, em ritmo intenso e crescente. A atmosfera do filme tem início leve, mas a tensão pouco a pouco se esgueira, tornando-a cada vez mais constrita, tirando o ar do espectador à medida em que o círculo se fecha em torno dos personagens. O formato da obra é majoritariamente convencional, mas há cenas em que o diretor ousa um pouco mais, aproveitando posições de câmera, planos e movimentos de câmera bastante criativos, criando estranhamento no público e uma sensação de desequilíbrio. Coisa rara para mim, “surda” para cinema que sou, consegui perceber, em algumas situações, uma participação bastante efetiva da trilha sonora como elemento da narrativa – mais do que apenas ensejar sensações ou emoções, músicas e ruídos auxiliam na própria construção da história. O filme conta com alguns efeitos especiais, ótimos na época e que envelheceram muito pouco, mantendo-se bem razoáveis. As interpretações, marcantes, justificam-se pelo elenco cheio de intérpretes competentes e famosos. O excelente Donald Sutherland interpreta o protagonista Matthew, repetindo o trabalho excepcional, marcado por angústia e tensão, que já apresentara, anos antes, no festejado “Inverno de Sangue em Veneza” (1973); Brooke Adams interpreta a desacreditada Elizabeth, numa atuação bem convincente; Jeff Goldblum, num de seus primeiros trabalhos de destaque no cinema, interpreta o amigo de Matthew, Jack; Veronica Cartwright, uma atriz de talento pouco reconhecido, interpreta a personagem Nancy e está perfeita no papel; Leonard Nimoy, o eterno Sr. Spock, aqui interpreta um psicólogo renomado, Dr. Kibner; numa clara homenagem, Don Siegel, diretor de “Vampiro de Almas”, faz uma pequena ponta como motorista de taxi, prestigiando, assim, a refilmagem de sua obra. O filme é beeeeem bacana, não fica devendo quase nada ao original, até porque tem um elenco bem superior. Eu curti muito e recomendo pacas!
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