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"Marvin", de Anne Fontaine, 2017

  • hikafigueiredo
  • 14 de abr. de 2020
  • 3 min de leitura

Filme do dia (149/2020) - "Marvin", de Anne Fontaine, 2017 - Marvin Bijoux (Jules Porier) é um menino com evidente orientação homossexual que sofre com a homofobia dos colegas e da família. Adulto, ele expurga suas más lembranças através de uma peça de teatro onde expõe todos aqueles que o humilharam na infância.





O filme é, antes de tudo, um manifesto contra a homofobia, visto "de dentro" da questão. Mas, a obra também é uma narrativa de sobrevivência em um meio preconceituoso e de superação dos traumas e dores resultantes deste preconceito. Há, ainda, um toque de vingança na narrativa, pois a forma que o personagem encontrou de superar e expurgar os traumas veio através da exposição crua e simples de diversos atores dos fatos relatados. Se, por um lado, não é um filme leve - há, sim, bastante dor envolvida -, por outro ele é bem menos traumático que outras narrativas parecidas, onde a violência chega a colocar a própria vida do agente em risco. Na história, Marvin sofre com a homofobia explícita dos colegas e um pouco mais velada de sua família, por si só disfuncional. Marvin, por seu lado, tenta, o máximo possível, ser invisível, evitando conflitos e jamais reclamando das violências sofridas. A reação só vem na idade adulta, quando coloca, no papel e no tablado do teatro, as experiências de sua atormentada infância. A narrativa alterna o tempo passado, na forma da infância de Marvin, com o presente, através de inúmeros momentos de sua vida adulta jovem, sem muita lógica nessas idas e vindas temporais. O ritmo é lento, tudo ser passa de uma maneira pausada, Marvin é, antes de tudo, um observador. Engraçado... o personagem Marvin me despertou muita empatia, pois é da minha natureza ter empatia com quem é, de alguma forma, excluído. Mas, curiosamente, tive empatia por um dos personagens que, de certa, também fazia Marvin sofrer: Dany, o padrasto do protagonista. Dany era um sujeito rude, grosseirão, estúpido com a família. Mas, ao longo da história, é perceptível que ele fazia o que estava ao seu alcance para cuidar dos seus. Em outras palavras, dentro dos recursos que Dany tinha - e que eram bem poucos -, ele fazia o seu melhor. Isso fica claro em três situações: quando ele ressalta que jamais agredira os enteados (para ele, agredir era o sinônimo de ser mau pai; não agredir era, portanto, o oposto); quando ele entrega um pouco de dinheiro para Marvin e diz para ele ter cuidado com os imigrantes de Paris (ele está sendo xenofóbico, é evidente, mas, ao mesmo tempo, ele está tentando cuidar de Marvin); e quando ele, passa a dizer que Marvin é gay (e não "bicha"), após este assumir sua homossexualidade (de certa forma, ele tenta mudar sua postura para acolher, de um jeito tosco, eu sei, o protagonista). No fim, fiquei com pena do personagem Dany por ele ter tão poucos subsídios para ser "gente". O filme tem uma fotografia legal, suave, agradável aos olhos. Gostei dos muitos planos de detalhes do rosto do personagem central, sempre atento ao discreto Marvin. Mas, o forte aqui, está nas atuações: o pequeno Jules Porier é uma graça, tem lindos e expressivos olhos, e sua tentativa desesperada em ser discreto, sempre, torna o personagem muito verossímil; Finnegan Oldfield interpreta Marvin adulto e consegue dar continuidade àquela figura discreta, contida, verdadeiramente reprimida, do Marvin criança - e ele faz isso muito bem; Grégory Gadebois interpreta o limitado Dany e também está ótimo, pois o personagem tem espessura, nuances, não é simplesmente o "cara mau"; a diva Isabelle Huppert interpreta a si mesma, lindíssima; no elenco, ainda, Catherine Mouchet, Catherine Salée e Charles Berling. Como eu gosto do tema, eu curti, apesar de ter localizado várias "crueldades" de todos os lados. É uma obra que merecia uma análise mais aprofundada, mas que daria spoilers e que nem caberia aqui, uma pena. No fim das contas,. eu recomendo.

PS - a narrativa é uma autobiografia do do escritor Edouard Louis.

PS 2 - Finnegan Oldfield ganhou o César de Ator Revelação pelo papel.

 
 
 

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