Filme do dia (156/2023) – “O Caminho das Nuvens”, de Vicente Amorim, 2003 – Romão (Wagner Moura) e sua esposa Rose (Cláudia Abreu) partem, de bicicleta, com seus cinco filhos, da Paraíba em direção ao Rio de Janeiro. Romão busca um trabalho que lhe pague “mil real” e perseguirá seu sonho, custe o que custar.
Uma mistura de road movie com filme de superação, a obra vai acompanhar a família de Romão e Rose ao longo de milhares de quilômetros de estradas, cortando o país de norte a sul. A primeira vez em que o assisti, eu achei o filme ótimo e bem “costurado”... Algo aconteceu neste intervalo de, sei lá, uns dezesseis anos, porque, na revisita, senti falta de conteúdo dramático – ainda que reconheça potencial na história, tive a sensação de que o roteirista precisou torcer com todas as suas forças a ideia para criar situações dramáticas que sustentassem a obra. Não é que eu passei a achar o filme ruim – ele tem algumas boas ideias e boas passagens -, mas ele me pareceu bem menos interessante no review. Eu diria que é um filme irregular e um pouco esvaziado – ele tem bem menos densidade do que seria o ideal. Além disso, peguei um ranço gigantesco pelo personagem Romão (e aí entra muito da minha visão de mundo e experiência pessoal) – o “cabra” enfia a família toda na estrada atrás do sonho dele, mas, ao longo dos 3.200km de trajeto, ele só colocou a família para trabalhar, ele mesmo não pegou no pesado em momento algum. Para piorar, o personagem tem uma postura machista e autoritária (o que seria de se esperar, considerando tratar-se de um homem rude e analfabeto do interior do agreste). Então... o personagem foi lindamente construído, é super crível, mas é um tremendo de um “fdp”, não consegui digeri-lo, sorry. Acho que o filme também peca pela ideia de superação, pois, aqui, a superação acaba se concentrando na façanha de pedalar meses a fio, porque, o desfecho mesmo, é pífio. O filme traz uma fotografia bem criativa, que alterna diferentes usos técnicos da câmera – temos de câmera na mão a lindos travellings e panorâmicas, alternância de planos gerais com outros mais fechados, uso de luz plena, contraluz e contrastes de luz e sombra, sempre fazendo uso de tons quentes, remetendo ao calor do interior do Nordeste brasileiro. O desenho de produção, da mesma forma, mostra-se adequadíssimo, trazendo uma ideia bem sólida da quela sociedade e lugar. Tive algum problema com a edição de som, principalmente nos diálogos, mas desconfio seriamente que o problema é na minha televisão, então relevem. A interpretação, claro, irretocável, afinal falamos de dois intérpretes excepcionais do cinema nacional – Wagner Moura e Cláudia Abreu... como já mencionado, os personagens foram muito bem construídos e interpretados com rigor pelos dois. Vale pontuar, ainda, o bom trabalho de Ravi Ramos Lacerda como o filho mais velho do casal, Antônio – o garoto deu sangue ali, é perceptível. Ótima ponta de Sidney Magal como o empresário Panamá (adoro ver o cantor em suas incursões cinematográficas!!!!). Carol Castro, ainda desconhecida, faz uma pequena ponta como Sereia. Como assisti com a expectativa de quem tinha uma recordação muito positiva do filme, acabei um pouco decepcionada com o que vi. Acho que o calcanhar de Aquiles está no roteiro um tanto frágil. Mas não me arrependo de rever – é sempre bom apoiar o cinema nacional e valeu pelo trabalho técnico de todos os envolvidos.
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