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hikafigueiredo

"O Rei da Noite", de Hector Babenco, 1975

Filme do dia (70/2022) - "O Rei da Noite", de Hector Babenco, 1975. São Paulo, década de 40. O estudante Tertuliano (Paulo José) apaixona-se perdidamente pela jovem Aninha (Dorothée Marie Bouvyer). No entanto, por questões de saúde, eles se afastam, dando início a uma longa carreira de conquistas amorosas de Tertuliano.





A obra, com forte influência das histórias de Nelson Rodrigues, discorre sobre a desilusão amorosa do personagem Tertuliano - ou, Tezinho -, que, como consequência, atira-se na noite paulistana e passa a se envolver com prostitutas e artistas de cabaré, enquanto, diante da sociedade, porta-se como bom rapaz até casar com uma jovem de boa ascendência e formar família. Confesso que tive sentimentos bastante contraditórios em relação ao filme. Se, de um lado, gostei do desenvolvimento da narrativa, que traz uma forte crítica aos costumes e à hipocrisia da sociedade, de outro desenvolvi profunda antipatia pelo protagonista, um homem cruel, machista e misógino, sem qualquer responsabilidade afetiva e dado a relacionamentos abusivos - o tratamento dispensado a todas as mulheres com quem o personagem se relaciona ao longo da história, com exceção de Aninha, é deplorável e, ainda que entenda que esses temas e questões sejam por demais atuais, praticamente inexistindo na época em que o filme foi feito, não consigo não me deixar influenciar por eles. A narrativa é linear, com grandes elipses de tempo ao longo da história. O ritmo é bem marcado e constante. A atmosfera começa leve, mas ganha peso no decorrer da narrativa, como uma agonia crescente - quanto mais Tezinho afunda-se em relacionamentos violentos e disfuncionais, mais tive essa sensação de agonia. Tecnicamente, o filme deixa um tanto a desejar - senti falta de nuances na fotografia, eu a achei muito "chapada", ainda que não ruim. Mas o que me incomodou mesmo foi a edição de som - acredito que em nenhum momento da obra foi usado som direto, ou seja, tudo foi editado, todos os diálogos foram dublados e, de certa forma, eu "percebi a presença do estúdio de som" (não sei se me fiz entender, mas é que a sonoridade é diferente, no estúdio o som não reverbera como em outros ambientes e, para mim, isso ficou meio evidente). Mas, se nos quesitos técnicos encontrei problemas, o elenco me agradou bastante, em especial o trio Paulo José, Marília Pera e Vic Militello. Diria que o filme apoia-se principalmente nestes três intérpretes, todos ótimos. Paulo José, um ator que adoro, lega consistência ao personagem Tezinho - ele é odioso, mas um odioso com espessura; Marília Pera, sempre fantástica, está maravilhosa como a prostituta Pupe e Vic Militello, que interpreta a esposa Maria das Graças, também está irretocável - ambas as personagens têm uma aura trágica, muito bem aproveitada pelas duas atrizes (a cena em que Pupe cai de amores pelo violento Tezinho e a cena em que Maria das Graças volta para casa molhada da chuva são sensacionais). No elenco, ainda, Yara Amaral, Cristina Pereira, Emilio Fontana e Márcia Real. No geral, o filme me agradou, apesar das ressalvas já mencionadas. Recomendo - sem alarde, mas recomendo.

5 visualizações1 comentário

1 Comment


Christine Leboucher
Christine Leboucher
Nov 21, 2023

Sim, também estou sentindo muito profundamente esta agonia, apesar da atuação maravilhosa do elenco... Que personagem desagradável, que comportamentos revoltantes... Estou na metade do filme e fico até na dúvida se vou assistir o filme até o final, pois inevitavelmente as situações só vão piorar... Talvez amanhã... ;-)

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