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hikafigueiredo

"Para Sama", de Waad Al-Kateab, 2019

Filme do dia (74/2021) - "Para Sama", de Waad Al-Kateab, 2019 - Durante cinco anos, a cineasta síria Waad Al-Kateab filmou seu cotidiano na cidade de Alepo, desde os primórdios da revolução que intentava derrubar o presidente Bashar al-Assad e instituir um governo mais democrático, até o sufocamento dos rebeldes, a evacuação da população sobrevivente da cidade de Alepo e o exílio forçado de Waad e sua família.





Contundente, dramático e urgente são os melhores adjetivos para esse documentário em primeira-pessoa realizado pela jovem cineasta Waad. Com um olhar que só quem vive aquela realidade é capaz de produzir, a obra é um drama humano que registra a existência em uma situação de guerra civil difícil de compreender por quem está de fora. Waad e seu marido foram ativistas pela libertação do país das mãos do governo corrupto, sanguinário e antidemocrático de al-Assad desde os primeiros movimentos rebeldes, iniciados dentro da Universidade de Alepo. Ela filmou as primeiras manifestações e a alegria juvenil daqueles que acreditavam poder mudar a situação do país para algo melhor. Filmou as tropas do governo tentando encerrar as manifestações. Filmou as prisões arbitrárias e os primeiros corpos que surgiram com sinais de tortura e execução sumária. Filmou os bombardeios, a cidade sitiada pelas tropas governamentais e os feridos. Filmou os mortos, os muitos, os inúmeros, os infinitos mortos no conflito - todos civis, dentre os quais idosos, mulheres e crianças, muitas crianças. Ao mesmo tempo, Waad filmou sua vida - seu casamento, o cotidiano do casal, sua gravidez, o nascimento de sua filha Sama, para quem ela dedica e justifica seu documentário - tudo, ou quase tudo, sob severos ataques aéreos. É chocante ver, principalmente, a reação das crianças à guerra, a normalização do conflito, bombardeios e mortes por parte dos pequenos. A filha de uma amiga afirma que certo local foi atingido por uma "bomba de fragmentação": seja lá o que for isso, não é algo que uma criança deveria reconhecer. Sama, filha de Waad, com seu pouco mais de um ano, sequer chorava quando ouvia as explosões próximas ou via os feridos ensanguentados que chegavam às centenas no hospital onde o pai trabalhava e para onde teve de se mudar para ficar em (alguma) segurança, tamanha a familiaridade que tudo isso tinha. Não é uma obra fácil de ser vista, mas é, sim, necessária. Necessária para que exista um novo olhar para os refugiados, um olhar mais compreensivo e empático. Necessária para que exista uma pressão mundial para que cessem as atrocidades do governo de al-Assad. Mas, acima de tudo, necessária para que as pessoas entendam o que é um conflito armado e o evitem, sempre que possível (ainda que eu entenda que nem sempre é possível, já que existem lutas legítimas que se tornam carnificinas justamente porque quem detém o poder não aceita a mudança e prefere assassinar sua própria população a deixar o poder). Apesar de sofrer com o documentário, eu o achei incrível. O filme ganhou o prêmio BAFTA de Melhor Documentário e concorreu ao Oscar na mesma categoria. Recomendo demais.

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