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"Pra Frente Brasil", de Roberto Farias, 1982

  • hikafigueiredo
  • 3 de jan. de 2021
  • 3 min de leitura

Filme do dia (07/2021) - "Pra Frente Brasil", de Roberto Farias, 1982 - Brasil, 1970. Jofre Godoy (Reginaldo Faria) é um cidadão classe média comum e apolítico que aceita uma carona de um desconhecido sem saber de sua ligação com grupos de resistência à ditadura militar imposta ao país. Perseguidos por policiais, o desconhecido é morto a tiros e Jofre é detido e levado aos porões da ditadura.





Uma das primeiras obras que trata abertamente das atrocidades cometidas pelo governo durante a ditadura militar brasileira e, possivelmente, a mais contundente e explícita, o filme escancara a corrupção e violência estatal e expõe os horrores da tortura, expediente largamente utilizado contra os desafetos políticos do governo da época. A obra tem méritos indiscutíveis no que tange ao assunto tratado - a história demonstra como ninguém estava a salvo dentro do estado de exceção imposto e qualquer indivíduo poderia ser a próxima vítima da violência praticada pelo estado; revela, ainda, como a sociedade estava mergulhada na corrupção que estendia seus braços a todos os setores, em especial, junto ao empresariado que, mediante propina, financiava o governo e a manutenção daquela situação; retrata, também, a hipocrisia da sociedade de um lado e, de outro, a profunda ignorância da população, pois, sim, havia quem ingênua e bovinamente acreditava na idoneidade do governo, caindo na esparrela da "ameaça comunista que ameaçava o país" (pfff); aponta como o futebol - dentre outras distrações - foi usado para desviar a atenção da população numa clara política do "pão e circo"; e, como poucos filmes, expõe, abertamente, a prática da tortura contra prisioneiros políticos e qualquer pessoa tida como subversiva. Sob tais aspectos, o filme é exemplar e digno de nota. Já do ponto cinematográfico, a obra traz alguns problemas que não chegam a estragar o filme, mas deixam um tanto a desejar. O roteiro, em linhas gerais, é bastante bom, mas se perde um pouco nos detalhes, como, por exemplo na orientação espacial dos fatos - o tempo inteiro o espectador tenta situar as ações, que ocorrem entre Rio de Janeiro e São Paulo, mas é completamente impossível entender onde exatamente; outro ponto fraco, na minha opinião, é o arco do romance entre os personagens Miguel e Mariana - gente, o mundo caindo, os amigos morrendo ou sendo torturados, não sei se alguém nessa situação encontra clima para romance, mas, mesmo que tivesse cabeça para tanto, o filme coloca, acompanhando as cenas dos dois personagens, uma musiquinha suave e melosa completamente equivocada e que quebra, totalmente, a "vibe" da narrativa (e que me fez querer arrancar meus tímpanos de raiva). A qualidade técnica do filme também deixa a desejar, mas sei que esta era a regra na época, tanto pela limitação orçamentária quanto pela qualidade dos equipamentos usados então - portanto, não espere muito da fotografia e do som da obra. Quanto às interpretações, poucas vezes vi elenco mais irregular - se de um lado temos Reginaldo Faria, Antônio Fagundes, Elizabeth Savalla e Carlos Zara em interpretações muito competentes, de outro temos Natalia do Vale exercendo toda sua canastrice, bem como quase todo o elenco de apoio, péssimo. Cabe destacar a coragem de Reginaldo Faria em fazer as terríveis cenas de tortura (só de ficar de cabeça para baixo todo o tempo das cenas já é admirável sua entrega ao personagem). Saudades de Luiz Armando Queiroz, um ator que eu sempre adorei (mas que aqui interpreta um grandessíssimo fdp). A obra, enfim, é uma aula de política, muito embora não seja, cinematograficamente falando, a sétima maravilha do mundo. Merece ser visto? Mais que merece, DEVE ser assistido, principalmente por quem ainda tem ilusões acerca dos anos de chumbo no Brasil - que, consoante temos percebido, é gente demais no país.

 
 
 

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