Filme do dia (287/2021) - "Terra Tranquila", de Geoff Murphy, 1985 - O cientista Zac Hobson (Bruno Lawrence) acorda uma manhã e descobre-se totalmente só no planeta. Ele passa a vagar pelas cidades atrás de outros sobreviventes, até encontrar Joanne (Alison Routledge). Paralelamente, ele busca explicações para o que aconteceu, acreditando que o cataclismo que varreu a vida da Terra teve íntima ligação com o projeto secreto mundial no qual trabalhava antes do evento.
A obra, uma produção neozelandesa, aborda a questão da responsabilidade dos cientistas quanto aquilo que pesquisam e o uso inconsequente do conhecimento científico. A história revela, ainda no início da narrativa, que a misteriosa ocorrência que fez com que a vida humana praticamente desaparecesse da superfície terrestre teria relação com o projeto de pesquisa secreto em que o personagem Zac trabalhava. A hipótese vem acompanhada de diversas explicações da Física para o que poderia ter acontecido, isto é, onde teria ocorrido o "bug" que levou a esse resultado, mas meus parquíssimos conhecimentos em exatas me impedem de tecer qualquer comentário quanto a verossimilhança ou absurdo de tais explicações. Diria mesmo que o filme vai além da física e propõe hipóteses metafísicas para a situação em que os sobreviventes se encontravam - estas, com certeza, bem pouco verossímeis. Ainda que a narrativa contenha diversos flashbacks, eu diria que ela é prioritariamente linear. O ritmo é lento e mesmo próximo ao fim, ele se mantém relativamente moroso. A atmosfera é, desde o princípio, de desalento, angústia, quase depressão. A solidão de Zac quase o leva à loucura e ele só é resgatado dos braços da insanidade quando ele se depara com Joanne - aliás, trecho ótimo do filme. Algumas cenas - inclusive a final - esbarram em questões de lógica, então, dá para afirmar, mesmo sem conhecimento de física, que o roteiro tem alguns "buracos", os quais, sinceramente, não estragaram a experiência do filme. Existe, também, certa intersecção entre situações que acontecem nessa obra e no filme recentemente visto "O Diabo, A Carne e o Mundo" (1959), ainda que com abordagens profundamente diferentes. O filme usa subterfúgios visuais para indicar certos acontecimentos da Física - assim, numa cena em que há uma variação planetária em uma característica dos elétrons (nem me peçam para explicar exatamente o que, porque sou absolutamente incapaz de dizer, quiçá saber!) nossos personagens veem tudo meio distorcido, tem alucinações, etc, e a imagem reproduz aquilo que eles veem e sentem. A fotografia traz posicionamentos de câmera criativos e efeitos ousados, justamente pelo motivo retro mencionado. Eu gostei muito do trabalho de Bruno Lawrence como Zac - ele tem uma expressão de dor tão grande em alguns momentos do filme que cheguei a ficar tocada. As interpretações de Alison Routledge e Pete Smith não me chamaram tanta a atenção, mas tampouco diria que foram ruins... não, estão os dois bem em seus papeis. Eu destacaria, além das cenas em que Zac mostra-se um tanto quanto instável por causa da solidão, a cena derradeira, que, para mim, foi chocante (e muito muito triste). Também não posso deixar de mencionar uma frase lapidar de Zac - "Fui condenado a viver". Olha, se ignorarmos os "buracos" do roteiro - que são fáceis de serem ignorados -, a obra é bem bacana - eu fiquei super envolvida com a história e não cochilei mesmo após uma noite de sono ruim. Eu curti sim. Recomendo.
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